(Quando o desalento se instala, há notícias que nos fazem querer continuar a acreditar. O conflito entre os estivadores de Lisboa e as empresas de estiva teve recentes desenvolvimentos e é pena que os que tanto criticaram os primeiros, intoxicando a opinião pública contra eles, não façam idêntica publicidade do que se começa agora a apurar. Se, por um lado, se começam a conhecer as fraudes cometidas, por outro, o que ninguém diz é que, desde há meses, há um grupo de trabalhadores em Lisboa, a quem não deixam trabalhar. Para este Governo, aparentemente comprometido com quem é suspeito de insolvência dolosa, é chegado o momento de dizer “basta” e escolher, por uma vez, o lado certo. Aqui, como em tantas ocasiões, é do lado dos trabalhadores. “Shame on you”, Ana Paula Vitorino.)
Steinbeck escreveu que “há mais beleza na verdade, mesmo que seja uma verdade medonha”. A verdade é que, ao contrário do que tantos escreveram, 2020 termina com a certeza que, tão depressa, não vai correr bem.
Enquanto nos confrontamos com as restrições ao que sempre demos por garantido e colocamos a esperança nas vacinas, eu fixo-me no desemprego a crescer e nos sinais tão evidentes de pobreza que despontam. Assola-nos um sentimento de tristeza que não é aliviado pelos anúncios publicitários, repletos de luzes e de imagens de uma felicidade que tarda em se fazer sentir.
São pessoas – como nós mas com um ar recentemente envergonhado – a pedir à porta de estabelecimentos de restauração, entre anúncios subtis de despedimentos colectivos que se banalizaram. São lojas que, de repente, não reabrem ou o café do bairro que encerrou portas. A livraria a que sempre fomos e que corre o risco de fechar. As pequenas empresas que desistiram porque já não dava mais.
Em qualquer dos casos, tratam-se de postos de trabalho que se perdem, enquanto os demais tentam festejar (como nos deixam…) o Natal. Repito. Assola-nos um sentimento de tristeza que não é aliviado pelos anúncios publicitários, repletos de luzes e de imagens de uma felicidade que tarda em se fazer sentir.
É certo que a época convida a pensamentos optimistas e promessas de mudar o mundo. Contudo, por pior que seja a verdade, escolho olhar para ela de frente. Não, não vai ficar tudo bem porque a vida não se faz de cartazes postos em janelas. No final de cada dia, de todos os dias, há contas que têm que ser pagas e pessoas que vão passar a consoada sabendo que o que lhes garantia isso acabou.
Uma vez mais, a pergunta não é, portanto, se vai correr bem. É saber o que podemos, todos, fazer para que corra melhor. Não apenas no Natal e no fim-de-ano. Durante todo o ano. Todos os anos.
Que venha 2021 não apenas com esperança mas com concretizações e do lado certo. Já não nos podemos dar ao luxo de ter menos.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.