O caso Raríssimas tem inflamado a opinião pública, centrando os ódios do país na pessoa de Paula Brito Costa. O país discute as gambas, os dois vestidos e o BMW. O país não tolera a ascenção de Paula Brito Costa, não perdoa a exibição do seu sucesso. O país não cuidou de aferir do percurso da Raríssimas, de como se afirmou, dos cuidados que presta aos seus utentes, da qualidade dos seus serviços.

Paula Brito Costa, pelos vistos deslumbrada pelo sucesso que inegavelmente teve, caiu em pecado; depois de muito crescer, começou a inchar. Foi capaz do melhor e do pior. Erigiu uma obra de referência com inquestionável visão, muito trabalho e a necessária coragem. Tratou de pôr tudo a perder quando se assume como dona  e senhora do que não é realmente seu. A Raríssimas deve muitíssimo a Paula Brito Costa, e Paula Brito Costa deveria à Raríssimas um comportamento muitíssimo mais correcto. O país deve muito respeito à Raríssimas, e não o tem tido, arriscando-se a irresponsavelmente deitar o bebé fora com a água do banho. Paula Brito Costa diz que o país lhe deve um pedido de desculpas; não deve. Devem ambos um sentido pedido de desculpas a todos que usufruem da Raríssimas para viver a vida com mais qualidade.

Este caso funda-se numa realidade calada, que poucos têm coragem de denunciar. Ainda está na memória de todos o célebre “quem se mete com o PS, leva!”. Esta frase tão curta, quanto verdadeira e elucidatória, encerra a realidade do modo como o PS coloniza o Estado e gere as relações de dependência entre cidadãos, instituições e o Estado dominado pelo polvo socialista. A Segurança Social é um dos casos paradigmáticos desta acção condicionadora.

Assistir de perto às perseguições que Vieira da Silva fez no seu regresso ao poder a alguns directores regionais da Segurança Social que não eram do partido, nem estariam disponíveis para trair o interesse público, é todo um tratado de patifaria e de práticas lesivas do interesse do Estado e dos cidadãos. Basta seguir as afirmações públicas e até hoje indesmentidas, porque verdadeiras, do anterior Director Regional da Segurança Social de Braga, Rui Barreira. Sempre se disse que Vieira da Silva é politicamente muito forte, daí Sócrates e Costa, duas faces da mesma má moeda, não prescindirem dos seus serviços. O problema para nós, é que no PS ser politicamente forte é ser implacável na colonização do Estado pelos boys, é não ter vergonha de encaixar a família, a própria e a dos camaradas, é não ter pejo de conduzir purgas condenáveis, é não ter pudor de usar o poder como meio de submissão e controlo.

Vivi muito de perto a acção do Ministério da Segurança Social do Governo Passos Coelho. Pedro Mota Soares e a sua equipe trataram num momento difícil do país de estabelecer pontes com todos, valorizando a economia social como nunca. Lembro-me de como era inédito para os actores do sector social ver a distribuição de meios, fundos e apoios com base unica e exclusivamente no mérito e na acção das instituições. Gente ligada historicamente ao PC ou ao PS ultrapassava gente do PSD ou do CDS, se apresentasse melhor trabalho, sem dramas, com a maior naturalidade, como tantas vezes aconteceu, e bem. Os critérios eram claros. Terão acontecido eventuais erros pontuais, como em tudo, mas sempre foi transparente que não havia favorecimento “de cor”, ainda menos prezuízo por discordância.

Senti que era um tempo novo e inédito. As pessoas respiravam livremente e não tinham medo. Falavam aos governantes das suas instituições, do trabalho desenvolvido, das dificuldades enfrentadas e dos méritos alcançados, sem precisar de exibir o cartão partidário.

Esta circunstância de dependência das instituições de subsidios de um ministério tem a perversidade de obrigar a vítima ao silêncio, sob pena da asfixia total. Ninguem é realmente livre de se queixar sem pôr a sua instituição em risco. Conformam-se os enteados à dificuldade, enquanto os prediletos brilham na exibição da sua plumagem rosa. O apoio, o subsídio, ora são chicote, ora são mimo.

Paula Brito Costa é uma das muitas pessoas na sua posição, que compreendeu isto muito bem. Jogou segundo as regras do jogo, esquecendo talvez que o benefício da sua instituição significaria o prejuizo de outras que não têm a mesma vocação para lamber botas, apostando no “cavalo certo”. Transformou-se numa caricatura de muitos outros que abanam a cauda ante a tal força política de Vieira da Silva e a implacabilidade da máquina socialista no aparelho do Estado. Temo que cairá sozinha, Vieira da Silva continuará politicamente forte entre familiares, amigos e capatazes de confiança.

O país, todos nós, continuaremos a discutir as gambas, o BMW e as tardes românticas em Copacabana.