A recente chegada ao Algarve de um grupo de 28 migrantes indocumentados é pretexto para relançar a discussão e um alerta relevante sobre a existência de um corredor que, depois de um ensaio em dezembro, foi seguido por quatro outros desembarques que totalizam já 76 pessoas.
Em comum, estes desembarques que podem ter origem em Marrocos e seguem o padrão de alguns anos no Mediterrâneo: uma quase miraculosa chegada a terra firme, uma embarcação frágil repleta de pessoas em estado carenciado e sem documentos. Estas viagens denotam uma organização profissional após a experiência inicial bem-sucedida, com a maioria dos desembarcados a fugir ao controlo nacional e a ter sucesso na sua jornada. Ato que cresce em regularidade e em número de participantes, ao que se regista agora a entrada de mulheres (uma grávida) e um menor.
Embora a informação seja ainda incipiente, as embarcações pressupõem um reboque durante parte de um percurso que não é longo, com a inexistência de documentação individual que dificulta qualquer identificação, definição de origem e consequente expulsão.
Neste tipo de viagem já confirmada por imagens do FRONTEX no Mediterrâneo, os desembarcados denotam boa condição física e todos transportam telemóvel, apesar de não serem portadores de documentos, o que lhes permite manter contactos e dispor de GPS que assinala o destino. Isto indicia que quem chega sabe o que deve assumir para dificultar uma decisão de expulsão, o que em tudo encaminha para uma estratégia, muito acima de uma simples travessia de férias até ao Algarve.
As autoridades, quando alertadas, têm desempenhado a sua função de acordo com a lei. Contudo, têm-se verificado atrasos significativos na decisão de expulsão que permitiram a fuga e a libertação de alguns dos migrantes. Este êxito é o convite para a continuação de novas viagens e novos desembarques. A fiscalização, mesmo que eficaz, não conseguirá impedir todas as viagens que buscam a nossa costa. A permissividade da lei e a decisão tardia perspetivam a convicção de que somos um alvo fácil, com violação da fronteira nacional, mas também da fronteira europeia.
O Governo recusa reconhecer um corredor algarvio que se projeta para um novo trajeto de migração ilegal. Não estão em causa migrantes que fogem da guerra ou de ações violentas nos países de origem, nem de alguém habilitado ao estatuto de refugiado. Falamos de quem procura dar o salto. Dirão alguns que estes migrantes não buscam refúgio em Portugal, mas que perante o crescente aperto na costa espanhola, o Algarve apresenta-se como uma sólida porta de entrada para quem projeta encontrar aqui a alavanca para a Europa. Sem documentos, mas… com telemóvel.
Por muito que se queira manter as opções em aberto, para evitar um crescendo de chegadas, além de um acrescido reforço de vigilância, impõe-se uma discreta mas vigorosa ação diplomática junto dos nossos vizinhos a sul. Em simultâneo com a devolução à origem dos migrantes expulsos com recurso eventual aos navios da Armada na falta de alternativa.