Uma das empresas mais extraordinárias a actuar em Portugal, o Banco Comercial Português (BCP), anunciou na semana passada um despedimento colectivo. Um processo de reestruturação que agora está a terminar e no âmbito do qual os sindicatos chamaram a atenção para a desproporcionalidade, unilateralidade, demasiada celeridade e absoluta desnecessidade.

É certo que a pandemia provocou a destruição de centenas de milhares de postos de trabalho, causou muito sofrimento em inúmeras famílias, e colocou sectores inteiros da economia em situação periclitante. Mas as empresas de telecomunicações e os bancos não sofreram qualquer impacto com a pandemia de Covid-19. Antes pelo contrário. No caso do sector financeiro, o processo político das moratórias evitou um cataclismo. Acresce que, fazendo aumentar os volumes de crédito e de negócio, as moratórias incrementaram o produto bancário, reduziram as provisões para cobranças duvidosas e fizeram disparar os lucros.

Isto dito, confrontados com processos de reestruturação no meio da pandemia, ainda assim a actuação dos sindicatos pautou-se pela razoabilidade, privilegiando sempre o diálogo. Nesse contexto, ocorreram inúmeras reuniões com o BCP, foram expressas as posições dos sindicatos em artigos de opinião e em diversas entrevistas na comunicação social.

Os sindicatos procuraram sensibilizar os grupos parlamentares, a ministra do Trabalho e o ministro da Economia para a desnecessidade destas reestruturações, na forma e no conteúdo. Faltou aos sindicatos procurar sensibilizar o primeiro-ministro, que não nos recebeu, e cuja ausência e silêncio são ensurdecedores, tanto mais que fora tão lesto a tratar, e bem, dos lesados do papel comercial do GES.

O próprio Presidente da República recebeu a União dos Sindicatos Independentes, ficando a par do que estava a ocorrer na banca. Em suma, os sindicatos procuraram exercer todo um magistério de influência, em nome da razoabilidade.

Nada demoveu, porém, a actual comissão executiva do BCP. Ao contrário da sua antecessora, não conseguiu, ou não quis, evitar um lamentável despedimento colectivo.

Alcançado este ponto, o BCP passará a integrar o lote das grandes empresas que se comportam apenas como maximizadoras de lucros, ignorando tudo o resto, incluindo as suas responsabilidades sociais. Por isso, esgotadas todas as vias do diálogo e da razoabilidade, e porque a isso os obrigam aqueles que ignoram as suas responsabilidades perante todos os stakeholders, os bancários vão fazer greve.

Será a primeira greve de todos os sindicatos em 33 anos.

Isto dito, os distraídos António Costa, Rui Rio, Francisco Rodrigues dos Santos, João Cotrim Figueiredo e André Ventura devem fazer aquilo que se impõe: condenarem, à semelhança do que fizeram outros líderes partidários, a ausência de responsabilidade social destas grandes empresas despedidoras; mexerem nos bónus de quem despede sem necessidade; reporem os valores de indemnização por despedimento nos níveis pré-troika; e, reintroduzirem o princípio do tratamento mais favorável para os trabalhadores, em sede de leis laborais.

E, sim, queremos saber se os nossos líderes partidários são heróis e responsáveis, ou meros cúmplices de quem faz mal ao povo votante e contribuinte.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.