Mario Draghi publicou no Verão aquilo que ficou conhecido como o relatório Draghi, que inclui duas recomendações chave: um forte aumento do investimento na UE, público e privado, sobretudo nos sectores de alta tecnologia, para reduzir o atraso de produtividade face aos EUA; remover os obstáculos que fragmentam o mercado único europeu.
Em Dezembro, aquele italiano fez mais um importante discurso, que já está a ser conhecido como Draghi Plus, por constituir um acrescento significativo ao relatório de referência do Verão.
Começa por citar um estudo do FMI, que estima que as barreiras ao mercado europeu são equivalentes a uma tarifa de 45% sobre o sector industrial e uma de 110% nos serviços. Se estas barreiras fossem reduzidas para o nível prevalecente nos EUA, a produtividade comunitária poderia aumentar 7% em sete anos, o que seria muito relevante, até para permitir um aumento dos salários, que têm crescido muito menos do que os dos norte-americanos.
Um outro obstáculo muito importante é a falta de um mercado de capitais europeu integrado e a excessiva dependência do sector bancário, que não é adequado para financiar os sectores do futuro, da economia digital, com “cash flows” voláteis, elevada probabilidade de insolvência e activos intangíveis.
A novidade (o “Plus”) está na defesa da necessidade de estimular a procura interna, cuja debilidade terá sido responsável não só pelo baixo crescimento em geral na UE, como também da produtividade. Um elevado excedente externo diminui a procura interna e é sintomático que, em 2024, se espere que a UE tenha um excedente externo de 3,6% do PIB, enquanto os EUA deverão ter um défice externo quase simétrico, de 3,5% do PIB.
Draghi fala sempre em termos agregados, mas os grandes responsáveis do excedente europeu são a Alemanha (excedente de 7% do PIB), Países Baixos (11%) e Suécia (7%). Aliás, a economia alemã seria aquela que mais necessitaria de estímulo.
Apesar de todo o interesse destas recomendações, é necessário cuidado para não as extrapolar directamente a Portugal, sobretudo no que diz respeito às contas externas.
Devido a erros clamorosos de política económica, o nosso país passou de uma dívida externa insignificante em 1995 (8% do PIB), para níveis estratosféricos em 2011 (110% do PIB), que têm vindo a ser corrigidos, mas ainda estão relativamente elevados (63% do PIB). Por isso, não estamos em condições de aligeirar as preocupações com o equilíbrio externo, sendo importante ter cautela com estímulos à procura interna, para não se traduzirem no regresso aos défices externos.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.