Com a ratificação da decisão sobre os fundos próprios por todos os Estados-membros da União Europeia, é dado o “tiro de partida” para o financiamento do Fundo Europeu de Recuperação e Resiliência, com um orçamento de 672,5 mil milhões de euros. Agora, cada país terá de ver aprovado o plano nacional que submete a Bruxelas para começar a receber as respetivas verbas.

Já muito se falou do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) nacional. No total, serão 16,7 mil milhões de euros (divididos entre 13,9 mil milhões de euros em subvenções do plano europeu e 2,7 mil milhões de euros por empréstimo), para financiar projetos que têm de ser executados até 2026, em que sejam demonstráveis o impacto imediato na recuperação económica e a geração de emprego.

O desafio passa por robustecer a capacidade de o país responder às necessidades de desenvolvimento social, reforço da coesão territorial e robustecimento do aparelho produtivo, sem que isso implique agravamento do rácio da dívida pública sobre o produto interno bruto a gerar.

É a quadratura do círculo. A que Portugal já se foi habituando ciclicamente, e que nem por isso se tem traduzido em sucesso. Quantas vezes já foram lançadas reflexões relativamente aos fatores de vantagens competitivas do país? Quantos estudos sobre a estratégia, sobre as opções de desenvolvimento, e quantas vezes ficaram grandes intenções na gaveta?

Em 1995, Portugal tinha 78% da remuneração do trabalho média (medida em Paridade do Poder de Compra) da União Europeia. Hoje, são 74%. Quando a Irlanda passou de 86% para 116% no mesmo período. A República Checa, Estónia, Letónia e Lituânia passaram todos para a nossa frente. Também no mesmo período, a Produtividade por Hora Trabalhada na Irlanda passou de 99% para 224% da média da União Europeia. Na Eslovénia, esse indicador passou de 49,3% para 70,6%. Na Eslováquia, o salto foi de 19% para 57,9%. Apenas para dar alguns exemplos.

Mas, quando verificamos os indicadores de formação e de escolaridade, a par dos indicadores de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), as explicações para estas discrepâncias começam a surgir. Faz-se luz quando se conclui que a Irlanda e a Estónia detêm uma cultura de investimento que leva a que o FBCF represente um terço do seu Produto Interno Bruto (PIB) em ano de pandemia (2020). Na República Checa, esse indicador é de 25,1%. E na Letónia, é de 23,4%.

Em Portugal, no ano de 1995, ainda se investia 23,3% do PIB. Mas, no mesmo ano em que os nossos parceiros europeus mais enérgicos não tiraram o pé do acelerador, a FBCF terminou nos 19,1%, claramente abaixo do valor médio da União Europeia, que se fixou em 21,6%.

Um dia, um grande amigo meu disse-me uma frase lapidar que nos caracteriza como povo: somos conservadores de esquerda. O que parece antagónico, mas que diz muito de nós. Somos muito bons a defender algo e o seu contrário. Somos progressistas, mas q.b. Defendemos a mudança, mas só vamos às aulas teóricas. Temos uma fatal atração por nos colocarmos ao lado do empreendedorismo público. E derrotamos qualquer campeão da iniciativa própria. Será que é agora?