1. Estamos numa boa altura para as empresas medíocres progredirem. A frase, se saída do nada não fará sentido, mas vejamos com algum detalhe o que está a pandemia de Covid-19 a provocar na sociedade e na economia em particular.
Já aqui defendemos que, num período tão difícil em termos de emprego e crescimento como o atual, seria horrível criar um muro entre os empresários que sempre pagaram todas as contribuições e os outros. Fomos os primeiros a defender que o acesso a fundos de ajuda às empresas e a particulares deveria ser dado a todos, independentemente da situação contributiva.
O Governo terá ouvido esta prece e agiu bem, sendo que hoje é possível a regularização prestacional para quem tem dívidas em execução coerciva, tal como é possível o acesso a concursos públicos para quem não tem a situação contributiva regularizada.
Ora, se a medida foi bem tomada não podemos cair na ingenuidade de pensar que esta benesse não será aproveitada por quem não tem escrúpulos, nomeadamente pelas empresas grandes e pequenas que apostam no trabalho que roça o ilegal e que, por exemplo, não têm problemas em, perante um rol de dívidas, responderem a um concurso em situação de favor, desresponsabilizando-se de obrigações contratuais. Na prática, conseguem ganhar concursos públicos abaixo do preço e criam uma situação de concorrência desleal face a empresas cumpridoras.
Cabe ao Governo ajudar as empresas débeis porque mantêm empregos, mas, a montante, impedir que existam vencedores tóxicos com valores abaixo do preço-base.
2. Já se falou muito de eleições presidenciais, dos vencedores e dos vencidos, dos gastos mínimos, das tendências de empresas e da extrapolação dos mesmos. Os analistas tendem a enfatizar um partido jovem pela performance que conseguiu, mas também já escrevemos que o sucesso do partido Chega se deve aos partidos do arco da governação.
Mais. Quando todos se viram contra o mesmo estão, naturalmente, a trabalhar para esse partido pois dão-lhe visibilidade e espaço. Ora, os vencedores foram outros: Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) e quem o apoiou em primeiro lugar, António Costa. Não há reconfiguração da direita, nem esmagamento da esquerda.
As presidenciais são o espaço para enviar cartões vermelhos que dificilmente se reproduzem numas legislativas. O PS sem candidato deu o apoio explícito de notáveis a MRS, enquanto o PSD e o CDS deram o apoio tradicional. É preciso não esquecer que a maioria dos votos em Marcelo são votos recomendados pelo maior partido nacional, e tal não significa uma alteração ideológica. O Chega recolhe os votos de protesto ou os “descamisados”. A liderança de Ventura terá de transformar esta massa de votantes em eleitores que sigam ideias e não “claims”, sob pena de ser o partido derrotado nas autárquicas e nas legislativas.
A direita deixou de ter vergonha mas não se reconfigurou, pois está à espera de uma liderança forte e com ideias. Talvez seja este o período de Pedro Passos Coelho e, dessa forma, congregar os ideais de uma ideologia. Na extrema-esquerda as perdas foram em votos úteis para Ana Gomes e não em perdas de eleitorado, mas a votação em Ana Gomes terá um impacto no PS: criou divisões e um claro distanciamento de Pedro Nuno Santos versus Fernando Medina na candidatura à futura liderança dos socialistas.