O novo Governo tomou posse há dias. Curiosamente, o principal palco das movimentações políticas no país por mais de quatro anos será, ainda assim, o Parlamento. Talvez não seja isso que a maioria de nós pense sobre a política neste futuro próximo, mas é ali que se vão materializar as intenções do Governo.
As relações entre o executivo e o legislativo, sem perdermos de vista Eurico Brilhante Dias e Augusto Santos Silva, dependerão em grande parte de uma ministra, a ministra Adjunta dos Assuntos Parlamentares. Ora, não só o Parlamento será mais do que nunca uma assembleia polarizada, ainda que com uma maioria absoluta do PS, com a procura de uma maior visibilidade por parte dos “novos” partidos agora com mais deputados e a luta pela sobrevivência dos que perderam muitos assentos; como será ali que o país verá serem aprovadas linhas importantes da governação.
Mas, voltemos àquela que é a tomada de decisão política na qual contamos com o Parlamento. Sabemos que o processo de feitura de políticas públicas dos governos, especialmente em Portugal, depende de uma interacção entre o que é o poder executivo de legislar e o que é o poder legislativo do Parlamento. Mais concretamente, quando se analisam teórica e empiricamente estas relações, conforme demonstrado em “As Relações entre o Executivo e o Legislativo em Sistemas Parlamentares: A Feitura de Políticas Públicas e os Processos Legislativos“, concluímos que quando os governos têm uma maioria absoluta no Parlamento, é mais provável que os mesmos apresentem legislação sob a forma de Propostas de Lei do que de Decretos-Lei.
Talvez esta ideia seja, à partida, contraintuitiva, até porque os tempos deverão ser, em média, maiores no Parlamento. Ainda assim, tendo a garantia de uma maioria, os governos portugueses, normalmente, fazem-no. Contudo, como ainda não temos dados sobre o Governo que agora iniciou funções, saliente-se que assim foi no passado. Mais, veja-se como grande parte da legislação do anterior governo, especialmente após a não aprovação do último orçamento (eu sei, eu sei, as condições são distintas), usou grandemente e perante a sua posição de minoria no parlamento da sua capacidade de emissão de Decretos-Lei.
Ao percebermos sob que condições os governos, em sistemas parlamentares, como é o nosso caso, actuam, podemos compreender melhor estas dinâmicas de feitura de políticas públicas, i.e., propostas legislativas. Em boa verdade, quando os representantes desenham e propõem legislação fazem-no na tentativa de atingir certos objectivos políticos e, portanto, é relevante olhar para tal.
Então e o Presidente da República, perguntarão. Bem, o Presidente exercerá, com certeza, o seu magistério de influência. Todavia, em termos legislativos, ele está mais ou menos de “mãos e pés atados”. É que andar sempre a mandar recados ou a ameaçar dissolver o Parlamento não poderá ser solução recorrente. Seguramente que irá exercer a sua autoridade por outras vias, na medida em que os seus vetos podem ser sempre ultrapassados e têm custos – e mais elevados serão se os vetos forem feitos com frequência.
Portanto, quem estará na minha “mira” de cientista política e de cidadã, não serão necessariamente aqueles representantes políticos que parecem estar na ribalta, mas sim aqueles que no Parlamento tenham mão sobre as políticas que o Governo pretende executar. O poder político às vezes também é assim, silencioso, e com nome de mulher.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.