Cada vez que ouço Trump, o presidente em reality TV show, só recordo as palavras de Gnarls Barkley – “you really think you are in control, well/I think you are crazy”, no Crazy de 2006. Mas é uma loucura diferente, racional. Reedita a Madman Theory de Nixon, relembrada na “New Yorker” de setembro de 2017 por Steve Coll: para convencer o Vietnam a negociar nos seus termos, mandou levantar rumo à URSS, em outubro de 1969, B-52 com ogivas nucleares, que deram umas voltas à calota polar, para convencer Breznev que estava a preparar algo louco e levá-lo a pressionar os vietnamitas.
Então presidente há oito meses, Nixon chamou-lhe em conversa com Haldeman a Madman Theory – convencer URSS e Vietname que era suficientemente imprevisível para fazer uma loucura se desafiado.
Este episódio, contado por Sagan e Suri na “International Security” da Primavera de 2003, permaneceu secreto durante muitos anos. Trump é, pois, “apenas” um discípulo de Nixon, sendo que já Maquiavel escreveu que há ocasiões em que “é sábio simular loucura”.
Ameaças de 25% de tarifas a México e Canadá podem, de facto, ser um meio de os obrigar a fazer concessões e reforçar internamente a posição de Trump, negociador duro e que produz resultados. E dá a ideia de que cumpre o programa eleitoral, com uma mão-cheia de nada: combate à imigração ilegal, mas cujo recorde é de Biden (bateu o ano de 2019 de Trump); e ao contrabando de fentanyl, que a spokesperson da Casa Branca Karoline Levitt disse ser a causa de morte de dezenas de milhões de americanos – se o ridículo matasse, já não teria saído da sala –, além de o Canadá representar 0,2%! Citando David Moynihan, “everyone is entitled to his own opinion, not to his own facts”.
Estará Trump a implementar uma nova política externa, feita um ramo da política comercial? Negoceia com a Ucrânia a exploração das terras raras, o que preocupa Putin pois nesse dia acabou a invasão; ameaça correr com os palestinos de Gaza e fazer a Riviera do Médio Oriente, para aterrorizar o Hamas e fazê-lo deixar a guerra; anuncia tarifas de 25% à Europa (0,5% de queda do PIB, diz a “Capital Economics”) para exportar carros e produtos agrícolas.
Pode ser, mas esta receita não funciona dentro dos EUA. Como vai curvar a inflação e descer os juros? E cortar o défice orçamental? Bessent advoga o 3-3-3: crescimento de 3%, cortar o défice para 3% do PIB e produzir mais três milhões de barris de petróleo por dia. Musk não é homem para esta tarefa, é Tom Cruise. Não perca os próximos episódios.