O caso da Raríssimas deixa um grande amargo de boca ao nível da confiança que podemos ter na supervisão que a tutela governamental faz destas instituições. As explicações de Vieira da Silva não colheram. E fico-me pelo primeiro nível de análise da questão, já que sobre Paula Brito da Costa tudo já foi dito e pouca defesa terá. Sim, há um produto extremamente relevante e benéfico do seu trabalho e ainda bem que a sua obra ultrapassou o criador porque o criador claramente não esteve à altura da obra.

Como primeira nota, foi com um sentimento de pena que se assistiu à audição do ministro Vieira da Silva no Parlamento sobre o caso Raríssimas. Vieira da Silva está para o PS como Paulo Macedo para o PSD: os resultados que apresenta enquanto ministro da pasta que tutela são tão bons que da esquerda à direita é consensual. Ou era. Ficou claro que Vieira da Silva não levou a sério denúncias graves que mereciam toda a atenção do seu Ministério e não uma mera investigação que se arrastava há meses. As explicações dadas à sua volta, nomeadamente pela sua companheira, beliscam a própria mas também o ministro. Ambos, juntamente com a responsável da Raríssimas, estiveram juntos na Suécia para assinar um documento que o ministro não se lembra qual o objetivo. Não é credível que não se lembre ou não tenha tido o cuidado de se lembrar antes de entrar para uma audição no Parlamento. “Não sei, não me lembro” numa audição no Parlamento já tem direitos de autor e ficaram na memória pelas piores razões.

Como segunda nota e a propósito do título deste texto, as instituições de solidariedade social desempenham uma função essencial na Sociedade. Delas depende a sobrevivência de uma fatia muito importante e carenciada da população. A confiança nestas instituições é como na banca: quando é beliscada é a sua ruína. É preciso preservá-la a todo o custo.

Se fôssemos perguntar a todos os vice-presidentes e demais “consultores” e administradores “não executivos” de instituições, todos assinam contas, mas nenhum ou quase nenhum as faz. A maioria certamente sem consciência ou até porque as contas lhes chegam já com alguma maquilhagem. No final, a questão é só uma, é de Lei mas também de moral: se o papel dos órgãos sociais é assinar de cruz sem questionar, e quando falamos de IPSS que contam com financiamento público ainda que parcial, não estamos a ter despesas desnecessárias? Para quê remunerar órgãos sociais de IPSS se estes não servem, como demonstra a Raríssimas, como mecanismos de controlo das equipas de gestão mas antes as legitimam de forma cega?

A terceira questão que se coloca é que o caso da Raríssimas nos leva a pensar que o setor da Solidariedade Social está a funcionar como funcionaram até hoje as empresas públicas: um repositório dos ex-governantes que não encontram um lugar no setor privado, como que à espera de voltar a ser chamado para o campo quando as circunstâncias políticas o permitirem e uma fonte de receitas e privilégios complementares. Esta promiscuidade e clientelismo dá má fama à já de si má fama dos políticos. E pior, põe-nos a desconfiar se o dinheiro que está a ir para quem precisa efetivamente chega ao seu destino.