Tradicionalmente, a chamada economia do mar aborda isoladamente – em silos hermeticamente fechados – atividades como a pesca, a exploração de hidrocarbonetos, o turismo, a logística, a investigação marinha, a biotecnologia, a construção naval, a segurança e a produção de energia oceânica. Já a Economia Azul, enquanto conceito e princípio, tem a ambição de tratar de forma integrada e sustentável cada um destes setores, tendo presente que as referidas atividades económicas tanto podem gerar sinergias entre os respetivos agentes, como externalidades negativas (p.e. a sobre-exploração pesqueira agride o ecossistema marinho) que, naturalmente, carecem de mecanismos de equilíbrio.
A Economia Azul foi pela primeira vez discutida na cimeira do “Rio +20” (UN), em 2012, tendo como protagonistas os países costeiros e as ilhas-Estado. Recordo o papel do anterior governo na dinamização deste tema, quer pela via diplomática (com a realização da “Semana Azul”), quer na declarada ambição de aumentar o peso da Economia Azul no PIB, de cerca de 2,7% para 4,5% em 2020.
Num ano de eleições autárquicas importa pensar na Economia Azul como parte da agenda municipal, atendendo ao seu potencial socioeconómico. É expectável que em 2020 a Economia Azul venha a compreender, na UE, cerca de 7 milhões de empregos e um Valor Acrescentado Bruto próximo dos 590 mil milhões de euros. Há, com efeito, um enorme potencial de crescimento da Economia Azul em concelhos que reúnam, ou se proponham reunir, os seguintes ativos: geografia fortemente marítima; capacidade de oferta de atividades de lazer e de recreio no mar; espaço marítimo com elevada biodiversidade; infraestruturas logísticas; empresas de construção e reparação naval; transporte marítimo local (short-sea shipping) e/ou de longo-curso (deep-sea shipping); turismo costeiro e de cruzeiros; escolas e clubes de desporto náutico; e universidades e politécnicos. Fazendo um exercício teórico de mapear os concelhos mais propensos à Economia Azul (e correndo o sério risco de esquecer alguns), surgem de imediato Viana do Castelo, Esposende, Vila do Conde, Matosinhos, Porto, Gaia, Aveiro, Lisboa, Cascais, Almada, Setúbal, Sines, Faro, Ponta Delgada e Funchal.
Nestes municípios, as próximas eleições autárquicas podem e devem constituir um fórum de discussão de políticas públicas para a Economia Azul numa lógica bottom-up, das cidades para o mundo. O desenvolvimento do cluster da Economia Azul nas cidades deverá compreender toda a cadeia de valor: i) planeamento e ordenamento (no sentido de identificar as áreas mais adequadas por tipologia de atividade); ii) conhecimento fundamental e inovação (aproveitando as competências e infraestruturas laboratoriais e universitárias); iii) empreendedorismo (orientando o desenvolvimento de microempresas dedicadas às atividades náuticas); iv) turismo (no sentido de assegurar uma oferta adequada); v) engenharia e serviços náuticos (atividades de inspeção, conservação, reparação e abastecimento das embarcações); vi) ambiente e energia (p.e. dessalinização da água e energia eólica offshore); vii) educação e desporto (de forma a proporcionar uma rede de educação para o desporto náutico); e viii) posicionamento internacional (promovendo o intercâmbio de experiências com outras cidades e desenvolvendo um plano de eventos coerente com as atividades “azuis” da cidade).
Em epítome, o sucesso da Economia Azul no nosso país até pode depender em alguma medida das oportunidades internacionais e do enquadramento legislativo nacional, mas ancora-se na audácia e na capacidade de concretização dos autarcas do litoral.