Ainda que liberalizada há mais de 30 anos, a aviação europeia continua a ser um dos setores mais protegidos através de uma rede impercetível de subsídios fiscais que desafia qualquer lógica de equidade e de sustentabiliddade e, mais grave, impede o desenvolvimento de outros meios de transporte alternativos. A TAP, sob controlo total do Estado e dotada de 3,2 mil milhões do contribuinte, é a única companhia aérea com voos entre Lisboa e Porto. “Não A1, há 10 voos por dia” que competem em frequências e em preço com a CP, a empresa pública monopolista da ferrovia. Ambas gozam de um apoio incondicional do seu acionista – o Estado – seja através de financiamento direto ou, ainda mais alarmante, de um quadro legislativo europeu e nacional à medida dos seus interesses.

Tomemos o exemplo de um bilhete de avião entre Lisboa e Porto com o custo total de 40 euros. O IVA sobre este bilhete é mísero: uma taxa de 6% que incide apenas sobre a parte “tarifa”, cerca de 25 euros. O resultado? 1,50 euros em IVA. Se o destino do bilhete for Madrid (ou outro internacional), o IVA é zero. Comparando: com o IVA à taxa de 23% sobre o valor total da compra o resultado seria seis vezes superior. Já do lado do combustível para a aviação, este é completamente isento de ISP, o Imposto Sobre produtos Petrolíferos que pagamos todos os dias.

Por que razão o legislador foi tão cauteloso a baixar o IVA dos produtos do cabaz alimentar ou por que razão foi tão reticente em baixar o ISP nas bombas de gasolina e continua a manter esta situação “no ar”? Esta discrepância na tributação é desconcertante e revela uma outra forma de subsidiar o setor da aviação: não cobrar os impostos devidos. Esta política de subsídios fiscais não se limita a Portugal, é certo.

Mas cada país tenta equilibrar, como pode, esta balança. Por exemplo, em troca da ajuda estatal à Austrian Airlines, o governo austríaco proibiu os voos na linha doméstica mais popular do país entre Viena e Salzburgo que estão à mesma distância entre Lisboa e Porto e sem TGV. Em Portugal, tal medida acabaria com cerca de 14 mil operações aéreas e com 75000 toneladas de CO2 por ano e libertaria os preciosos “slots” da Portela, um dos motivos apontados para o próximo grande investimento público que endividará as próximas gerações: o novo aeroporto.

Neste contexto de agenda climática nos transportes, o governo português achou por bem começar pelo IUC dos veículos anteriores a 2007. Num país que oferece poucas ou nenhumas opções de mobilidade, esta medida poderá ter o efeito pernicioso de promover a venda de novos automóveis, seguramente comprados a crédito pelas pessoas de menores rendimentos proprietárias deste tipo de veículo. De facto, e como já revelou noutras matérias, este governo prefere perseguir os privados e os seus cidadãos do que, por exemplo, abdicar da ponte aérea altamente subsidiada da “sua” empresa aérea.

Em última análise, a questão da taxação da aviação em Portugal transcende a esfera fiscal para se tornar um dilema de justiça social e ambiental. Sobre isto, o governo demonstra uma visão seletiva da sua função, uma manipulação da ecologia e uma tendência para medidas avulsas, inconsequentes, descontextualizadas geograficamente e mascaradas de uma tinta “verde” que lhes tem sido, literalmente, mandada à cara por jovens ativistas. Não foi só com a nacionalização da TAP nem com o relançamento do projeto do aeroporto que se “inaugurou” a prática de subvencionar o setor da aviação.

Este setor tem um longo legado de subsídios públicos de toda a espécie. A proteção excessiva deste setor em detrimento de outros, aliada à falta de transparência e à ausência de um debate público informado, representa um flagrante desrespeito pelo interesse público e pelos desafios ambientais prementes. Querem uma sugestão? Se não quiserem proibir a ponte aérea da “vossa” companhia, comecem a cobrar, pelo menos, todos os impostos devidos pelos bilhetes vendidos neste trajeto doméstico e invistam esse dinheiro em políticas nacionais monitorizadas de promoção do transporte coletivo e adivinhem só o que poderá acontecer…os veículos anteriores a 2007 desaparecerão por si mesmos.