Ele, Carlos Costa, governador do Banco de Portugal (BdP) a propósito da alteração ao modelo de nomeação do governador do BdP.
Ele, Carlos Costa, governador do BdP nomeado em 2010 e reconduzido no cargo em 2015.
Ele, Carlos Costa, o mesmo que em 2014 garantiu a todos os portugueses e/ou clientes do BES que a situação do BES nada tinha de preocupante e que tudo seria resolvido.
Ele, Carlos Costa, o mesmo que depois de perceber ser incontornável a derrocada do BES, garantiu mais uma vez a todos que não existiriam perdas para os clientes.
Ele, Carlos Costa, o mesmo que há pouco tempo disse saber de tudo (sobre o BES), mas não ser sua função dizê-lo ou alertar quem quer que fosse.
Este senhor ocupa um cargo que, em nome da independência, era nomeado pelo ministra das Finanças e confirmado em conselho de ministros. Em 2015, passou a ter de ser sujeito a interrogatório no Parlamento, mas apenas para “fogo de vista”, porque não existia poder de rejeição.
Actualmente, a proposta é de passar a existir um novo órgão que partilha responsabilidades de supervisão com o BdP e, entre outras, que o governador seja nomeado pelo Presidente da República, após proposta do Governo e audição no Parlamento, que poderá opor-se à indicação.
Não só a criação de mais uma entidade supervisora está já a gerar polémica entre as diversas entidades envolvidas como também, a alteração que eu, em boa verdade, mais esperava, ansiava, sonhava… não acontece! Até porque a exoneração do governador do BdP está sujeita a recurso pelo próprio perante o Banco Central Europeu (BCE) ou o próprio BCE pode-se opor a esta exoneração.
Nos estatutos do BdP, o que está estabelecido é que todos os membros do conselho de administração da instituição (incluindo o governador) “são inamovíveis”. Ainda assim, salvaguarda-se que estes podem “ser exonerados caso se verifique alguma das circunstâncias previstas” nos estatutos do BCE. Ora, o que os estatutos do Banco Central Europeu dizem sobre essas “circunstâncias” resume-se a uma frase: “Um governador só pode ser demitido das suas funções se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das mesmas ou se tiver cometido falta grave”.
Mas o que será esta “falta grave”, se metade de tudo o que se passou deveria ser mais do que o suficiente? O Banco Português de Negócios (BPN), que foi o primeiro, ainda no tempo de Vitor Constâncio, deveria, no mínimo, ter servido de alerta. Também Vitor Constâncio dizia, na altura, que “a supervisão não tem como missão detectar fraudes”. Seria uma comédia se não fosse trágico.
De qualquer forma, parece não ser necessário definir o que é “falta grave”, porque também não há qualquer iniciativa para a exoneração deste governador. Se bem entendo, a “independência” é garantida pelo Governo. Que indica para nomeação – sem grande justificação ou parâmetros de avaliação públicos entre diversas personalidades –, mas não exonera, no matter what!
Cereja no topo do bolo é que nas andanças do “a bem da independência”, quando vários bancos faliram, quando a entidade de supervisão falha repetidamente, sob a liderança de um governador que mentiu, que empurrou com a barriga e que tem pautado a sua actuação por uma incompetência em série, Carlos Costa foi reconduzido. E por lá continua. Não há governo que o exonere… mas ele também consegue não ter vergonha que o force a demitir-se! É impressionante!
Do outro lado, temos Joana Marques Vidal, procuradora-geral da República desde 2012, de quem já se disse que poderia não ser reconduzida. Joana Marques Vidal que não tem descansado em fazer do seu mandato o que mais processos abertos teve, aquele – para não dizer único – em que mais personalidades públicas e políticas estiveram envolvidas, a única que está a querer fazer diferente e para (muito) melhor na justiça portuguesa. Uma mulher que tem demonstrado garra, determinação e competência, arrisca-se a não ser reconduzida.
Ou seja, aquela que investiga os causadores da derrocada que o outro senhor, com acesso às contas do banco e com funções de supervisão não previu ou alertou, poderá não ser reconduzida enquanto aquele que diz saber de coisas, mas que não era sua função partilhá-las não é exonerado… há alguma coisa que me escapa nesta lógica de independência de órgãos e de competência para a recondução ou é impressão minha? A mim parece-me mais a “independência” ao serviço dos “dependentes”.