Durante décadas, as autoridades responsáveis pela defesa da concorrência dedicaram muito tempo e esforço (e bem!) à investigação de aquisições que dão origem a participações cruzadas entre empresas no mesmo mercado, uma vez que tais aquisições têm potencial para diminuir a concorrência e aumentar o nível de preços no mercado, prejudicando os consumidores.

Estudos recentes (incluindo de economistas portugueses como Duarte Brito, Luís Cabral, António Osório, Pedro Pereira, Tiago Ribeiro e Helder Vasconcelos) têm, no entanto, vindo a mostrar que aquelas autoridades devem também dedicar o mesmo tempo e esforço a investigar aquisições que dão origem a estruturas de propriedade em que um ou mais acionistas participam em mais do que uma empresa concorrente no mesmo mercado.

Este tipo de estrutura está presente numa multiplicidade de mercados, para o qual muito tem contribuído o gigantesco montante de ativos que os grandes fundos de investimento têm para gerir. Veja-se, como exemplo entre muitos, o caso do mercado americano da aviação civil, ilustrado aqui. Este mercado é dominado por seis grandes empresas: American Airlines, Southwest Airlines, Delta Air Lines, United Continental, JetBlue Airways e Alaska Airlines. E os maiores acionistas de cada uma delas tipicamente detêm participações em mais do que uma empresa concorrente.

O fundo de investimento Berkshire Hathaway detém uma participação de 9,5% na American Airlines, ao mesmo tempo que detém uma participação de 15,0%, 7,3% e 9,1% nas rivais Southwest Airlines, Delta Air Lines e United Continental, respetivamente. E não é caso único. Pelo contrário. Os fundos de investimento BlackRock, Fidelity, PRIMECAP, Rowe Price, State Street Global e Vanguard, entre muitos outros, exibem o mesmo tipo de padrão, com participações em múltiplas das empresas concorrentes neste mercado.

Este tipo de estrutura de propriedade tem também potencial para diminuir a concorrência e aumentar o nível de preços no mercado, prejudicando os consumidores.

A teoria é simples. Estes acionistas comuns – dado que possuem interesses em mais do que uma empresa no mercado – quererão que cada empresa adote uma estratégia concorrencial menos agressiva quando comparada com a estratégia decorrente do objetivo tradicional de maximização do lucro. Uma vez que estratégias agressivas têm um impacto negativo nas empresas concorrentes e, por conseguinte, no retorno financeiro destes accionistas comuns.

Mas o problema é mais do que teórico. Os economistas José Azar, Martin Schmalz e Isabel Tecu mostram que no mercado americano da aviação civil, devido à existência destes acionistas comuns, os preços das tarifas, para a rota de distância média, são efetivamente cerca de 3% a 7% mais elevados, enquanto que o volume de passageiros é cerca de 4% mais baixo. E isto apesar das suas participações em cada uma das empresas não ultrapassar os 15% (e serem tipicamente bem inferiores a esse valor).

Estes resultados sugerem assim que aquisições que dão origem a este tipo de estruturas de propriedade devem ser escrutinadas com cuidado pelas autoridades responsáveis pela defesa da concorrência.