“Olá, eu sou o João, o seu novo colega”. No mundo do trabalho este é um possível cumprimento que todos esperam receber aquando da chegada de um novo, ou nova, colega. Espera-se também que haja um padrão de simpatia, de recetividade, e da dita “normalidade social esperada”. Mas é aqui que reside a questão da aceitação da diferença, daquilo que se espera e daquilo que se está disposto a dar.

A nova lei 4/2019 relativa às quotas de emprego, que entra em vigor já este mês de fevereiro, vem de certa forma dar um impulso para as empresas se “obrigarem” a empregar determinado número de pessoas com deficiência consoante a sua dimensão. Mas esta lei deve ser encarada acima de tudo como um avanço para sociedade e humanidade, por vezes tão distraída e perdida por aí.

É preciso entender em primeiro lugar que a deficiência é uma condição humana que as pessoas não escolhem e não decidem carregar. É preciso entender também que são pessoas iguais às outras todas em primeiro lugar. Iguais como pessoas com direitos e deveres, no sentido mais digno da condição humana.

Logo, o raciocínio a fazer é imediatamente desconstruir determinados preconceitos que por vezes moldam o nosso pensamento quando estamos perante uma pessoa diferente e começar do zero. Aí sim, estaremos a fazer a diferença, aí sim estamos a integrar realmente o nosso colega e a perceber acima de tudo como ele é. Mas este trabalho de aceitação e integração pode e deve variar consoante o tipo de deficiência.

Na organização em que me encontro a colaborar, a APSA – Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger (SA), lidamos com uma deficiência que está na cara, mas não se vê. A síndrome de asperger é uma perturbação do espetro do autismo, do foro neuro-comportamental, considerado altamente funcionante no campo da neuro-diversidade.

Trabalhamos atualmente com 15 grandes empresas portuguesas, fruto de um percurso de cinco anos de trabalho, de dedicação, mas acima de tudo de um modelo inovador nesta matéria, que se traduz num acompanhamento transversal e sistémico do jovem ou da pessoa com SA em todas as fases da sua integração nas empresas, para além de que capacita os próprios colaboradores para o acolhimento ser mais eficaz.

É, como em todas as deficiências, essencial olhar em primeiro lugar para a pessoa como única, com o seu perfil individualizado. E aqui sim estamos a pensar mais à frente. Não podemos estereotipar os comportamentos, os gostos, as ideias ou os sonhos de cada um. Podemos sim ajudar a desbravar caminho para que cada um se sinta feliz e realizado na sua vida e no seu local de trabalho. E é este o trabalho que a APSA tem desenvolvido juntamente com empresas como a Accenture, a REN, o Santander, o Grupo Jerónimo Martins, Hospital da Luz, Quinta D’Avó, Sonae Sierra, Junta de Freguesia de Benfica, Recolte, entre outras.

O sucesso deste caminho e deste percurso vem não só da equipa técnica especializada que faz um trabalho fantástico, mas acima de tudo dos próprios jovens que nos chegaram sem sonhos, sem objetivos, muitos deles em estado de depressão e medicamentados.

É de facto preciso continuar este trabalho, é preciso que haja leis favoráveis à inclusão, mas acima de tudo é preciso ter muito cuidado com a forma como depois, no campo e na prática, se tratam estas pessoas. Acima de tudo são pessoas. E é aqui que entra o papel fundamental das organizações sociais como a APSA e tantas outras. É preciso que as empresas se socorram e se suportem destas organizações para construir da melhor forma o futuro destas pessoas.

Temos de partir sempre de uma base de win-win quando vamos ter com as empresas. É fundamental que as empresas sintam que têm um parceiro que as ajuda a cumprir as obrigações legais, que estão no caminho certo. Prova disso são os resultados comprovados, no caso da APSA, que já empregou 35 jovens no mercado de trabalho, trabalha com 15 empresas e a taxa de sucesso deste programa de empregabilidade ronda os 85%.

Vamos construir juntos uma sociedade mais avançada e mais integrante da diferença!