A primeira reação, por parte de muitos contribuintes, à recente polémica que envolveu a participação do Estado na Inapa foi de interrogação. Porque carga de água está o Estado no capital de uma empresa do sector de distribuição de papel?

Segundo o artigo do “Eco” da semana passada, “o Estado tornou-se o maior acionista da Inapa após, em 2019, ter comprado a posição de 33% que a CGD detinha na empresa.” No entanto, parece que a Parpública detém agora 45% da Inapa.

Porque será que o Estado aumentou a posição na empresa, entretanto? E porque tinha a CGD esta participação? A quem presta o Estado contas?

Se olharmos para a lista de empresas públicas disponível no site da UTAM – Unidade Técnica de Acompanhamento e Monitorização do Setor Público Empresarial e das participações da Parpública disponível no site da empresa, encontramos empresas representando uma grande diversidade de sectores.

Faz parte das listas: uma marina, um autódromo, uma empresa de publicidade em transportes, estaleiros navais, turismo… E na carteira da Parpública encontra-se também a participação nos CTT, que demorou a ser pública e cuja justificação, provavelmente, carece de atualização.

A presença do Estado nestas empresas até pode fazer sentido, mas, em muitos casos, suspeito que já ninguém se lembra do porquê. Algumas podem ter sido o resultado de um processo político específico de que ninguém se recorda e foram ficando pela carteira de participadas do Estado

O Instituto Português de Corporate Governance (IPCG) reuniu durante o último ano um grupo de trabalho com o objetivo de olhar para a governance do Sector Empresarial do Estado. O primeiro produto deste grupo de trabalho foi a preparação de um conjunto de recomendações com vista à melhoria da governance das empresas públicas.

Uma das recomendações consiste na definição de uma política de detenção para cada empresa do Sector Empresarial do Estado. Essa política de detenção serviria para explicitar a razão pela qual o Estado está presente especificamente no capital da empresa.

A existência desta política e a sua divulgação faria com que o Estado tivesse de prestar contas aos cidadãos sobre a racionalidade de uma empresa ser sua participada e poderia também chamar a atenção para os benefícios de uma eventual privatização. Esta obrigação de estabelecer uma razão é válida para diferentes orientações políticas da Assembleia da República, com um impacto fundamental em termos de transparência face aos eleitores.

Poderia não evitar que a opinião pública fosse surpreendida por situações como a da Inapa, mas, pelo menos, existiria um historial claro e público sobre as razões porque o Estado participou a cada passo na vida da empresa. Existiria uma justificação para esta participação ou uma decisão pendente de privatização. Por isso, recomendamos que esta política seja atualizada regularmente.

Não podemos esquecer que o Estado exerce o seu papel de acionista em empresas no interesse dos cidadãos, a quem devia prestar contas.

A coluna Boa Governança tem periodicidade quinzenal e resulta de uma parceria editorial entre o JE e o Instituto Português de Corporate Governance.