“Je suis furieuse contre les Allemands”, palavras de Ebba Busch, Ministra sueca da Energia e Indústria, numa conferência de imprensa a 19/12/2024, largamente referidas na comunicação social europeia. Para Ebba Busch, a política energética (Energiewende) da Alemanha é irresponsável e injusta, porque sobrecarrega as famílias e empresas suecas (e europeias, acrescento eu) com os seus preços elevados de electricidade, os chamados “preços alemães”, que os europeus têm de pagar, quando, no seu território, muitos países produzem-na a custos bem mais baixos.

Isto acontece porque a União Europeia está interligada em rede, possibilitando, deste modo, um equilíbrio alisado entre a oferta e a procura, a nível de todo o espaço europeu, com um regime de formação de preços estabelecido no mercado por grosso, no mínimo discutível (?) e desadequado que se repercute numa prática de preços elevados de electricidade, em benefício da Alemanha.

A Suécia é o segundo maior exportador líquido de electricidade para a União Europeia (o primeiro é a França) e, quer um quer outro país têm um mix de produção conjugada de hídrica, nuclear e renovável, que lhes permite produzir a custo mais baixo e de forma regular (não intermitente).  São também países de baixa emissão de gases com efeitos de estufa – CO2, enquanto a Alemanha é o pior da Europa.

2. A Alemanha, a principal economia europeia (por enquanto?!) apostou numa política energética de abandono da nuclear, iniciada com Merkel na sequência de Fukushima, reconhecida hoje como uma aposta falhada, inclusive por instituições e partidos da própria Alemanha, mas que nunca corrigiu como outros países o fizeram, entre eles, a Suécia.

Pior, esta política estendeu-se à União Europeia por imposição da Alemanha, e, hoje, continua com defensores ao nível da Comissão Europeia, com dois Comissários, assumidamente antinucleares, sendo um, o Comissário Europeu para a Energia, o dinamarquês Dan Jorgensen, que tem tentado dificultar quando não boicotar os países que não apostam cegamente nas renováveis (eólica e solar) como ainda recentemente aconteceu com a França e continua a pôr entraves a projectos da Aliança Nuclear Europeia, aliança essa maioritária, em termos de número de países, no seio da energia e reconhecida pela anterior Comissão de Ursula von der Leyen, para a qual foram aprovadas medidas, sobretudo no tocante a Investimentos em SMR (reactores modulares de pequena dimensão) a concretizar até 2030.

Neste contexto, é perfeitamente entendível e merecida a expressão de zanga profunda da ministra sueca, porque não é justo que suecos e restantes europeus paguem “preços alemães” por teimosia dos lóbis das renováveis que nem as necessidades da Alemanha conseguem satisfazer, em dias sem sol e sem vento, como ultimamente tem acontecido e continuará a acontecer, se a teimosia continuar e a UE não corrigir o  rumo, apostando numa estratégia óbvia para a energia, em que a nuclear tenha o espaço que lhe compete. São estas decisões/falhas de fundo que levaram a UE a perder competitividade à UE e a entrar em declínio continuado no contexto mundial.

O problema de fundo é grave

3. As sucessivas Comissões Europeias, desde o tempo em que Merkel decidiu sair da energia nuclear (houve uma onda, então, por toda a Europa, até Macron alinhou na redução da energia nuclear em França para substituir por renováveis), são corresponsáveis por toda esta estratégia de tragédia para a competitividade da União. As culpas maiores recaem, contudo, nas últimas Comissões que se demitiram de ter pensamento sobre a energia, apesar das boas achegas que a Ciência, entretanto, tem acrescentado, no sentido da escolha de outros caminhos. A Alemanha não mudou, os lóbis das renováveis instalaram-se e, até à data, domina a orientação das renováveis, apesar das provas de que não resolvem a situação. Para as eleições de Fevereiro, as expectativas de reviravolta apresentam-se favoráveis.

Lendo, com cuidado, o estudo do think tank Bruegel, de Bruxelas, pró-europeu, publicado em 2 de Dezembro 2024, sob o título: Uma estratégia de investimento para manter o Pacto Ecológico Europeu no bom caminho, deduz-se que a Europa não tem recursos financeiros para implementar a transição energética (tecnicamente discutível como refere o Tribunal de Contas e vários especialistas da matéria), traçada por Ursula von der Leyen em Julho de 2021.

O estudo, na prática, contém uma denúncia do mau desempenho da Comissão, embora não tenha sido essa a intenção do Bruegel. Mas, ao afirmar que a UE não tem capacidade financeira para despender os custos reais da transição energética de cerca de 1,3 triliões (trilions, francês) de euros por ano até 2030 para atingir a meta climática definida de redução de emissões de 55% e de 1,54 triliões/ano de 2031 a 2050 para atingir a neutralidade carbónica, não há outra leitura possível. Aliás, está escrito: “a Europa não está no caminho certo para atingir as suas metas climáticas”, apontando uma resistência à descarbonização cada vez mais forte e o esgotamento de meios financeiros quer ao nível da União Europeia quer dos Estados-membros.

A resistência das populações é cada vez mais forte porque ao Pacto Verde europeu se associam o aumento sucessivo de preços da energia e a noção de que as complicações recaem sobretudo sobre a vida dos mais pobres e com muitas empresas de diversos sectores a atravessarem profundas crises, encerramento e/ou deslocalização para outros países. Por outro lado, a ameaça de desemprego é uma realidade em empresas ícones da indústria europeia (química, automóvel, metalurgia, etc.) que estão a encerrar em vários países europeus. Numa outra frente, os agricultores estão em luta contra o Pacto Verde há muito tempo e agora, de novo, o Mercosul veio despoletar uma situação de concorrência desleal, ajudando a consolidar ainda mais essa resistência de rejeição.

Finalmente, o próprio Tribunal de Contas Europeu tem apontado várias incongruências ao Pacto Verde de transição, a diversos níveis, incluindo o tecnológico. A juntar, especialistas há que têm atacado a Comissão Europeia de não ter quantificado, deliberadamente, os verdadeiros custos do Pacto Verde por temer a rejeição de um programa debilmente fundamentado e dispendioso.

Situação a nível global

4. O modelo económico subjacente a esta transição energética está em causa pelos seus efeitos designadamente a grande desindustrialização que tem vindo a provocar, desde há anos. Como saída tem sido avançado o mito da “reindustrialização” que não está a acontecer porque lhe faltam as bases e os consensos.

Sem um largo consenso, no campo da energia, base de tudo, (a energia tem de ser encarada não como um simples ramo da economia, mas como algo instrumental para toda a economia) não há saída, até porque a UE tem vindo a perder vantagem em várias frentes (tecnologia e inovação) e se não acomoda o essencial dificilmente arrancará. E as instituições da União Europeia não estão a dar grande contributo até porque os desentendimentos entre si são muito profundos embora mais ou menos velados. Dirigentes europeus capazes (pensamento, conhecimento e acção) é o que faz falta porque, na realidade, não os há.

 O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.