O Governo iniciou já toda a operação de propaganda em torno do agora designado “Plano de Recuperação e Resiliência” (PRR). Já na próxima terça-feira, na Fundação Calouste Gulbenkian, será feita uma nova apresentação da “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica 2020/2030” por António Costa Silva, desta vez incluindo os contributos enviados por indivíduos e instituições, durante o período de discussão pública. Logo de seguida, no dia 17, esta versão do PRR será analisada em Conselho de Ministros e posteriormente existirão reuniões entre António Costa e os partidos com representação parlamentar.
É evidente que só posso saudar a abertura que existiu desta discussão junto da sociedade civil e é admissível que, entre os mais de mil contributos recebidos durante o período de discussão pública, existam ideias e sugestões muito válidas e pertinentes. Mas é importante que tenhamos em atenção que, quando no dia 22 o primeiro-ministro concluir o processo de diálogo e reunir, como agendado, com os parceiros sociais no Conselho Económico e Social, já a realidade se encarregou de deixar um cenário de ruína na nossa economia e no nosso tecido empresarial, entre o drama das insolvências e o desespero dos desempregados.
Sendo certo que o desemprego é um flagelo geral desta crise, com o emprego na Europa a registar a maior queda dos últimos 25 anos no segundo trimestre, não é menos verdade que em Portugal – de acordo com os dados mais recentes do Eurostat – o emprego desceu mais do que a média europeia de 2,7%, com um recuo de 3,4% na variação em cadeia e de 3,6% em termos homólogos.
Estas percentagens surgem-nos como frias mas representam pessoas concretas, seres humanos antes ativos e agora impossibilitados de trabalhar. E é fundamental termos em conta que a diminuição da população ativa tem um efeito fortíssimo sobre a segurança social, dado que o nosso sistema de reformas tem como base um modelo de repartição que não permite que existam mais pensionistas do que trabalhadores, sob pena de a sustentabilidade do sistema entrar em rotura.
Quanto às insolvências, uma simples consulta ao portal Citius evidencia uma realidade assustadora, com quase mil processos apenas nos últimos quinze dias. Só em agosto as insolvências em Portugal aumentaram 64,5% e, de acordo com a Crédito Y Caución, “à medida que os programas de apoio começam a expirar, o número de pedidos de insolvência deve aumentar rapidamente”, admite a empresa numa análise recente.
Regressando pois ao “Plano de Recuperação e Resiliência”, que ainda irei analisar na sua nova versão depois de apresentado, esperemos que seja efetivamente operativo. E que o diálogo que o Governo tanto afirma pretender seja uma vontade genuína de – o que não tem feito até aqui – ouvir aqueles que têm apontado caminhos e soluções para evitar aquilo que nenhum de nós quer e que a todos nos preocupa.