No momento em que este texto é escrito, Espanha continua em suspenso quanto ao seu futuro próximo.
Os partidos prosseguem as negociações, que entram na sua terceira semana, com vista à formação do governo esperando-se que, no cumprimento de um dos seus mais elementares deveres – a constituição de um governo estável com base nos mandatos que o povo soberano atribuiu a cada um deles –, rapidamente encontrem o necessário entendimento, evitando novas eleições, que deixariam o país vizinho em suspenso durante meses, como sucedeu em 2019.
O maior obstáculo a uma expedita solução é Pedro Sánchez que, ao não corresponder ao desafio lançado pelo líder do PP, no debate que os juntou durante a campanha eleitoral, de viabilização pelo partido vencido de um governo minoritário do partido vencedor, mantém o impasse.
Sánchez, ávido por continuar a habitar os aposentos da Moncloa, recusa-se a interpretar os resultados das eleições gerais do passado dia 23 de Julho que são de uma clareza cristalina: os espanhóis querem um governo moderado, na esfera do centro político. É o que se conclui do facto de os dois maiores partidos terem somado 64,7% dos votos, em contraste com os pouco menos de 49% que ambos alcançaram há quatro anos.
A bipolarização que os resultados expressam não significa outra coisa que não o desejo de um governo sem dependência das franjas radicais, que perderam força. Com efeito, à esquerda, o Sumar ficou aquém dos resultados do Podemos e, à direita, o Vox deu um expressivo trambolhão eleitoral que lhe custou dezanove deputados.
Sánchez, porém, não desarma. Pretende reeditar a solução política que governou a Espanha nos últimos quatro anos, que os nossos vizinhos recusaram nas urnas, e mantém a disponibilidade para negociar com os partidos cujo principal objectivo é a dissolução do país que o secretário-geral socialista pretende continuar a governar, estando, presentemente, refém do partido do foragido Carles Puigdemont.
Caso ceda ao Juntos pela Catalunha, cuja cabeça de lista, Miriam Nogueras, afirmou não estar preocupada com a governabilidade de Espanha – que considerará um país estrangeiro, embora vá tomar assento no respectivo parlamento –, Sánchez causará um dano grave à unidade do Estado.
A recusa de Sánchez em assumir as consequências dos resultados eleitorais afasta ainda mais o PSOE da sua posição histórica de partido moderado e constitucional. Oferece inclusivamente ao Vox a oportunidade de se exibir com uma aparência de razoabilidade, que se disponibilizou a viabilizar, sem condições, um governo minoritário do PP, aceitando votar ao lado do Partido Nacionalista Basco e da Coligação Canária.
Sánchez arrisca, assim, deixar nas mãos da direita radical a quebra do impasse político que, mesmo a contragosto, devia caber ao seu partido ajudar a resolver.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.