O salário médio bruto do espanhol ascende a 1.640 euros e o total da carga fiscal fica-se pelos 21,5% (contra os nossos 28,3%)

O trabalhador espanhol ganha mais do que o português, tem uma carga fiscal média mais baixa e paga menos contribuições para a Segurança Social. Resultado: os espanhóis ficam, em média, com mais 580,44 euros do que um português para se governarem durante o mês – e ainda gastam menos dinheiro a adquirir os produtos essenciais para viver. Não admira que a sua economia seja mais pujante do que a portuguesa e que os espanhóis tenham um melhor nível de vida líquido do que o nosso.

Muito se tem falado sobre a questão comparativa da produtividade e do desempenho das economias dos vários países, tentando sempre encontrar defeitos em Portugal e qualidades no estrangeiro.

Por outro lado muitas comparações são feitas entre Portugal e outros países, pecando as mesmas, normalmente e salvo raras exceções, por serem parcelares e apenas referidas a um ou dois indicadores.

Cabe-me tentar ir um pouco mais longe e verificar se as análises parcelares que têm sido feitas pelos diversos partidos políticos são isentas, ou se pelo contrário, são tendenciosas e variam consoante estão no Governo ou na Oposição.

Vejamos então o que se passa na realidade e não nos vários, e variáveis, discursos políticos.

 

O salário médio bruto nos 28 países da União Europeia

O salário médio bruto nos 28 países da União Europeia, incluindo portanto os países do leste europeu, é de 1.995 euros por mês, sendo em Portugal de apenas 986 euros.

Em termos do “ranking” Portugal ocupa a 18ª posição, no cômputo dos 28 Estados que integram a União Europeia. Mas se consideramos apenas os países da Europa Ocidental, com quem todos gostam muito de se comparar, então Portugal tem o salário médio bruto mais baixo da Europa Ocidental.

Segundo o Eurostat, têm salários médios brutos (antes dos descontos para a Segurança Social, para o IRS e quotizações) mais altos que em Portugal países como a Grécia (1.011 euros), Malta, Chipre, Espanha, Itália, França ou Áustria (2.383 euros) e ainda mais distante a Dinamarca (3.553 euros), como os salários mais elevados.

Os países com salários mais baixos são dez, todos eles da Europa de Leste, sendo que o país onde se paga o salário médio mais baixo é a Bulgária.

Caso para dizer que a nossa falta eventual de competitividade, enquanto país, não está nos salários mas sim noutros fatores de gestão tais como a organização e o planeamento.

 

Comparação dos rendimentos e carga fiscal na Península Ibérica

Façamos agora uma comparação apenas entre os dois países que ocupam a Península Ibérica, de acordo com os dados da OCDE.

Em matéria da carga fiscal média sobre o trabalho verifica-se que em Espanha esta é de 15,1%, sendo a contribuição média para a Segurança Social de 6,4%, num total de 21,5%.

Em Portugal a carga média fiscal média sobre o trabalho é de 17,3%, sendo a contribuição para a Segurança Social de 11% por trabalhador, que totaliza 28,3%.

No conjunto dos países da OCDE verifica-se uma carga fiscal, média, de 15,7% e uma contribuição para a segurança social, média, de 9,8%, ascendendo em média a 25,5%.

Os dados acima descritos permitem-nos perceber o que fica disponível para cada cidadão de Espanha e de Portugal. O que fica disponível para poupar ou consumir. Por outras palavras: para poder viver, como é seu inalienável direito.

O salário médio bruto em Espanha é de 1.640 euros. Subtraindo os impostos e taxas a que estão sujeitos, no valor médio de 21,5% (ou seja 352,6 euros), dá que os cidadãos que trabalham em Espanha ficam com 1.287,4 euros, em média, por mês, para poderem consumir ou poupar, ou seja para viver.

Já em Portugal, o salário médio bruto é de 986 euros. Subtraindo os impostos e taxas a que estamos sujeitos, no valor médio de 28,3% (ou seja 279,04 euros) dá que os cidadãos que trabalham em Portugal ficam com apenas 706,96 euros para poderem consumir ou poupar, ou seja para viver.

Os espanhóis ficam, em média com 1.287,4 euros líquidos, para viver. Os portugueses ficam em média com 706,96 euros líquidos, para viver. Logo, os espanhóis têm mais 580,44 euros por mês, em média, para gastar dos que os portugueses.

A economia espanhola agradece e os espanhóis também.

Mas poder-se-ia dizer, ou invocar, que o nível de vida em Espanha é mais caro do que em Portugal. Isto é, apesar de ficarem com mais dinheiro o custo dos bens essências para viverem seria mais caro do que no nosso país.

Ora o que os números reais dizem não é nada disso, como se poderá verificar a seguir.

 

Comparação ibérica em matéria de preços dos bens essenciais para viver

Na habitação, tomemos como exemplo o valor de uma renda de casa em Madrid e em Lisboa. No Bairro Salamanca de Madrid, um T3 varia entre os 970 a 1.600 euros de renda por mês, variando em Lisboa, em zona que se pode considerar similar, entre os 950 e os 1.500 euros. Ou seja praticamente o mesmo valor nas duas cidades.

Um levantamento de preços em supermercados em Espanha permite confirmar que os preços dos bens básicos de alimentação e bebidas, mas também de detergentes e outros similares, são quase iguais ou são mesmo inferiores aos encontrados, para os mesmos produtos, nos supermercados do nosso país

Quanto à rubrica de transportes, o preço em Espanha para a Gasolina (95) é de 1,21 euros por litro. Já o passe mensal de transporte público, em Madrid, cifra-se nos 45,00 euros mensais. Em Portugal o preço da gasolina 95 anda em redor dos 1,48 euros por litro e o passe mensal de transportes varia entre 35 e 75 euros consoante a modalidade, como é sabido.

 

Conclusão

Os espanhóis têm uma carga fiscal média mais baixa que os portugueses, contribuições para a Segurança Social igualmente mais baixas, pagam pelos produtos essências para viver, uma soma quase igual ou mesmo inferior à despendida pelos consumidores portugueses.

Mas o seu salário médio bruto mensal é bastante superior, são mais 654 euros de rendimento bruto por mês.

Já no que se refere ao dinheiro com que um cidadão espanhol fica depois de pagar os impostos para viver é de mais 580,44 euros por mês (em média) do que um português.

Na prática, os espanhóis ganhando mais, suportam menos carga fiscal e pagam igual ou menos dinheiro, pelos bens essenciais, que os portugueses, o que lhes deixa um salário médio líquido (depois dos descontos efetuados) bastante superior.

Não admira que a economia espanhola seja mais pujante que a portuguesa e não admira, em conclusão final, que os espanhóis tenham um melhor nível de vida líquido que os Portugueses.

Sendo assim, o problema da nossa baixa produtividade não vem dos salários praticados em Portugal.

É preciso encontrar a razão desse fenómeno em vários outros fatores tais como a deficiente gestão da maioria das nossas empresas, nomeadamente em matéria de organização e planeamento, bem como na constatação de que nos tornámos numa economia que produz produtos e serviços de baixo valor acrescentado por falta de investimentos sérios e continuados em Investigação e Desenvolvimento.

Neste quadro geral, encontram-se felizmente algumas (poucas infelizmente) exceções em empresas que são bem geridas, nas quais os seus gestores têm a noção que o seu principal ativo são as pessoas e como tal estas têm que ser formadas em continuo, têm que ser motivadas e remuneradas em consonância com os seus méritos e capacidades, para que estas rendam cada vez mais e se sintam bem nas empresas em que trabalham. 

Uma pessoa que passe grandes dificuldades para viver o seu dia-a-dia e alimentar a sua família, só por sorte (ou grande automotivação) vai trabalhar todos os dias de espírito liberto, de forma a ser mais produtiva.

E nesta situação, lamento dizê-lo, não há inocentes.

Dirigentes políticos, empresários ou dirigentes de empresas têm igual responsabilidade nesta matéria.

Enquanto estes três grupos não mudarem a sua mentalidade, a economia portuguesa dificilmente será florescente e saudável, com bons resultados para Portugal.

Vai sendo tempo de atentarmos nestas realidades e não embarcarmos nas meias verdades, ou mesmo mentiras descaradas, que nos têm sido vendidas por diversas formas comunicacionais.

Por Miguel Mattos Chaves, PhD