É difícil descortinar uma lógica económica (ou outra) em várias das medidas de Trump, porque várias delas parecem decorrer do desconhecimento de relações económicas básicas.

O novo presidente dos EUA parece ter uma obsessão com os défices externos, imaginando que isso decorre de problemas bilaterais com alguns Estados. Ignora que aqueles representam um desequilíbrio entre o investimento e a poupança e vai tomar medidas de aumento do défice público que irão, quase de certeza, aumentar o défice externo. Entretanto vai lançar tarifas, mas de uma forma tão aleatória e volúvel, que nem se percebe que resultado esperar. Devido a esta inconsistência, será de esperar haver impactos negativos contrários ao discurso oficial.

A Europa deverá ser uma das vítimas desta guerra comercial, devendo sofrer quer directamente, quer com as tarifas impostas sobre outros países, em particular a China, que poderá inundar os mercados europeus em substituição do norte-americano.

Neste conflito, os melhores aliados que os europeus podem esperar ter são os eleitores e os empresários norte-americanos. O que surpreende é que, pouco mais de um mês após a tomada de posse, já haja um conjunto de dados económicos negativos sobre os EUA que, a agravarem-se, poderão constituir um travão importante aos piores impulsos de Trump.

A confiança dos consumidores americanos é muito dependente da cor da presidência, havendo uma mudança muito forte em função do partido no poder, sendo essa diferença mais marcada no caso dos republicanos. Dado que passaram agora a deter o poder executivo, seria de esperar uma clara melhoria da confiança dos consumidores, até porque não houve ainda medidas com impacto económico visível.

No entanto, passou-se exactamente o contrário. Em vez da esperada lua-de-mel, houve uma quebra da confiança e, talvez o mais surpreendente de tudo, as expectativas sobre a inflação atingiram um máximo de mais de vinte anos. Uma das razões mais referidas para o pessimismo sobre os preços são as tarifas, que os americanos temem que façam subir os preços.

Por sua vez, os empresários norte-americanos têm sido muito críticos das tarifas, sobretudo sobre o Canadá e o México, já que cadeia de produção nos EUA está repartida entre estes três países com demasiadas interconexões. Aliás, a bolsa norte-americana tem tido um comportamento medíocre desde a eleição de Trump, embora em parte devido à surpresa da concorrência da chinesa DeepSeek na inteligência artificial.

As ameaças de expulsar os imigrantes ilegais também pode fazer subir os preços, sobretudo dos produtos alimentares, muito dependentes deste tipo de mão-de-obra.

Se estes primeiros sinais económicos negativos se reforçarem, a popularidade do novo presidente pode cair muito, arriscando-se a perder a maioria no Congresso nas eleições de 2026. Para além disso, o desagrado dos empresários, sobretudo via as cotações da bolsa, poderá também pressionar o executivo. Ou seja, é expectável que haja, pelo menos, alguma moderação de Trump nas suas decisões.

Curiosamente, Elon Musk, outra das figuras essenciais da nova administração, está a ser muito castigado com as quedas abruptas das vendas da Tesla na Europa e também, embora não tão intensas, nos EUA. A razão principal para esta diminuição parece ser o discurso político do empresário, que desagrada especialmente aos compradores de automóveis eléctricos.

Em resumo, este tipo de más notícias económicas dos EUA poderão constituir um travão às políticas mais extremas e acabarem por se revelar boas novidades para a Europa.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.