O mundo está em elevada mudança tecnológica, com enormes implicações sociais. São factos num contexto onde a semente de aceleração criada pela Internet nos anos 90 do século passado, e a mudança de conceito na utilização de dispositivos móveis autónomos “com vida própria” em 2007, com o lançamento do iPhone, se traduziram em pontos de viragem na forma como passámos a encarar o mundo.

Somos ao mesmo tempo atores principais e público deste teatro social e empresarial em que vivemos. Mudámos abruptamente de um modelo tradicional “oito horas, cinco dias por semana”, para um modelo digital da realidade humana “24 horas, sete dias por semana”.

No mundo digital passou a ser mais evidente a importância de, ao nível empresarial, quem faz e entrega a tarefa, o produto ou o serviço na data certa, no orçamento definido e na qualidade requerida. Ficou mais evidente quem trabalha, quem lidera e quem é responsável, tal como quem quer apenas um emprego, quem é chefe e quem não assume e foge de responsabilidades.

Tudo no mundo digital se torna mais evidente e mais exigente, independentemente de onde esteja o colaborador ou a empresa.

Face a estas realidades já certas, deveríamos ter um Estado incentivador de dinamismo e regulador para a competitividade de um país. Contudo, continuamos a assistir à tentativa de criar um Estado paternalista e controlador da gestão empresarial, reforçando limitações de iniciativas e de dinâmicas de criação de valor, esquecendo que um mercado mais dinâmico protege os trabalhadores, que terão mais oportunidades de trabalho em empresas válidas e eliminando aquelas que não tratam bem as suas equipas.

Ao invés de se procurar punir as poucas empresas que não sabem reconhecer o trabalho das suas equipas e as ostracizam para garantir poderes pessoais, ou punir aqueles colaboradores que bloqueiam, instigam conflitos ou procuram “empregos e não trabalhos”, o Estado vem dar indicações que devemos nivelar por baixo (uma vez mais).

As mais recentes alterações aprovadas na Assembleia da República às regras de teletrabalho, com pequenas exceções, procuram esquecer o quão importante foi o mundo digital para a garantia dos serviços mínimos e que asseguraram que empresas e empregos se mantivessem e, nalguns casos, pudessem crescer.

Medidas para considerar que “a empresa” não pode ligar fora de um horário 8×5, ou obrigar que o colaborador vá à empresa de dois em dois meses são exemplos sintomáticos deste distanciamento à realidade digital do que são as empresas na atualidade de um mundo da 4ªRevolução Industrial.

Quantas empresas nasceram 100% digitais e sem escritório? Quantas pessoas têm hoje dois ou três projetos paralelos, com empresas nacionais e internacionais, focados em entregáveis? Quantas pessoas conciliam a sua vida pessoal e profissional “à distância de um clique”, trabalhando em horários fora “do tradicional”, cumprindo os objetivos ou entregáveis, ao invés de estarem sentados numa secretária do escritório “só para cumprir calendário” num horário pré-definido?

O Estado não se pode substituir ao CEO ou acionista de uma empresa e definir-lhes como devem gerir os seus recursos. Os erros e os sucessos devem ser de quem lidera a empresa e não de ser um “paizinho” Estado do país. As empresas nascem e desaparecem de acordo com as boas lideranças de gestão, em cada momento. As pessoas querem trabalhar onde lhes criam boas condições e boas dinâmicas de evolução e motivação.

Um Estado acionista num mundo digital é um Estado que procura centralizar e limitar o crescimento individual e coletivo de um país.

Sejamos francos e honestos: quero trabalhar em empresas que valorizem as minhas competências, tal como estarei sempre numa empresa que me queira e onde eu queira trabalhar, tal como não quero trabalhar com colegas que não cumprem e não assumem as suas tarefas e responsabilidades. Não incentivemos o emprego, mas a dinâmica de oportunidades e crescimento do trabalho e do ser individual que colabora em equipas.