As curvas estão na moda esta estação. As exponenciais que ilustram a propogação do surto do novo coronavírus são as que vendem mais. Mas à medida que o impacto económico da Covid-19 se vai tornando mais real, outro tipo de curva começa a ganhar popularidade. Correndo o risco de parecermos o Cocas, o Ferrão ou um outro qualquer boneco a falar sobre o alfabeto na Rua Sésamo, passamos horas a discutir se a travagem (e subsequente recuperação) da economia global vai ser em forma de V, ou W, ou U, ou L.

A mais desejada seria a primeira, uma recessão ‘clássica’ com o V a representar uma queda rápida na atividade para um ‘fundo’ que seria de duração curta, antes de uma reaceleração igualmente rápida. Não são muitos os economistas que mantêm esta previsão relativamente otimista, porque a travagem inédita da economia foi e será tão abrupta que é impossível os efeitos negativos não serem longos. Além disso, é pouco provável que a retoma da atividade na produção e no consumo de bens e serviços seja linear – deverá ser com mais cautela, por fases e de natureza diferente, pois a pandemia vai certamente alterar os nossos hábitos. Os economistas que ainda acreditam na vitória do V dizem que o esforço dos governos e dos bancos centrais para estimular as economias deverão levar a uma retoma no quarto trimestre do ano, com uma aceleração em 2021. Isto desde que o surto seja controlado rapidamente e não regresse.

Se esses riscos se materializarem, a curva poderá assumir a forma de um W, com a economia a reagir rapidamente, mas a fraquejar de novo. Isto poderá acontecer se, por exemplo, os sistemas de saúde não estiverem melhor preparados (testes, ventiladores, pessoal) antes de um eventual novo surto no inverno. O mais recente exemplo deste tipo de recessão, também conhecido como ‘double dip’, foi a recessão global de 2008-2009, seguida de outra em 2011-2013 em alguns países da zona euro, incluindo Portugal.

Entre 1973 e 1975, a economia dos EUA viveu uma recessão, provocada pela crise do petróleo e um crash nas bolsas, em forma de U. Ou seja, uma retração que dura entre 12 a 24 meses, sem mini-recuperações pelo meio. “Entra-se na banheira, é escorregadio, e fica-se muito tempo sem sair”, foi como Simon Johnson, ex-economista-chefe do FMI, descreveu esse tipo de recessão. E o que poderá acontecer agora se a Covid-19 não for contida nas próximas semanas e obrigar a manter a economia ‘de molho’, atrasando o impacto das medidas de estímulo?

O cenário mais preocupante é o da recessão em L. A experiência da Grécia a partir de 2006 é um exemplo recente. Após entrar em contração, as várias levas de austeridade impediram o país de retomar o crescimento até 2017.

A possibilidade de a Covid-19 resultar neste tipo de crise prolongada é limitada, segundo a maioria dos analistas, mas não está totalmente descartada. Uma das causas poderia ser uma eventual crise da dívida, com o nível de defaults a provocar um aumento das yields. Seria como adicionar a crise das dívidas soberanas ao pior cenário do combate ao vírus. Os bancos centrais fariam tudo para evitar tal situação e, em qualquer caso, os sinais vindos da China mostram que leva tempo, mas é possivel conter o surto do novo coronavírus.

Esta recessão é tão diferente das anteriores que alguns economistas dizem que as letras não conseguem descrevê-la e que, se calhar, temos de usar símbolos como a raíz quadrada ou o swoosh do logo da Nike. E, para decifrá-los, vamos precisar de ajuda.