Em conversa com um amigo falávamos da presença quase hegemónica de Elon Musk nas notícias. Seja porque apoiou e vai fazer parte da administração de Donald Trump a partir de segunda-feira, dia 20, comprometendo-se a reduzir a dívida americana em 3 triliões de dólares, mas afinal de contas já será apenas metade desse valor, seja porque processou a OpenAI, seja ainda porque quer derrubar e eleger novos líderes políticos na Alemanha e na Inglaterra, ou simplesmente porque sim.

Elon, o empresário de origem sul-africana, naturalizado cidadão norte-americano e canadiano, está em todos os jornais e canais de televisão – e em todos “outros” meios de comunicação dos nossos dias, desde logo nas redes sociais, incluindo os grupos de WhatsApp pessoais e profissionais.

Ainda esta semana foi notícia, logo desmentida, que as autoridades chinesas estariam a avaliar a aquisição das operações do TikTok pelo magnata, se o Supremo Tribunal dos Estados Unidos resolver decretar o encerramento da plataforma, que é propriedade da empresa chinesa ByteDance – e pode fechar nos Estados Unidos a 19 de janeiro, um dia antes da tomada de posse de Trump.

Musk começou lentamente a ser conhecido publicamente como empresário de sucesso e por conseguir ganhar merecidas mais-valias ao vender negócios por si inventados ou em que participou, por exemplo o PayPal, o já velho serviço criado em 1998 e comprado em 2002 pelo eBay, que permite efetuar e aceitar pagamentos, enviando o dinheiro sem revelar as informações financeiras de quem o utiliza. Depois, já com alguma riqueza acumulada, foi ainda mais notícia por todos os seus negócios passarem a ser “estruturais” e incontornáveis para a sociedade global em que vivemos.

São todos negócios que, só pelos seus temas originais, já seriam uma autêntica novidade, mas que se tornaram, cada um deles, ainda mais “universais” e, por isso, ainda mais “notícia”. Para início de conversa, é cofundador e dono da Tesla, que nasceu para revolucionar os automóveis, prometendo um mundo que antes poderia parecer quase utópico, baseado na energia solar, alimentado por baterias e transportado por veículos elétricos. Tesla que é hoje também uma verdadeira máquina de inovação de Inteligência Artificial que pode começar a produzir robôs caseiros em apenas cinco anos.

Depois criou a Space X para projetar a conquista de Marte como planeta habitável, sendo talvez o principal player mundial – ultrapassando até a gigante NASA – na indústria espacial, tornando-se certamente a maior operadora comercial de constelações de satélites do mundo. Foi a primeira empresa privada a colocar humanos em órbita e a enviar humanos para a Estação Espacial Internacional (ISS), reivindicando ainda o maior lançamento de uma espaçonave para o espaço numa única missão, com 143 satélites.

E não se ficou por aqui, inventando a Starlink para dar acesso à internet com banda larga de alta potência em todo o mundo, mesmo nas zonas mais remotas e recônditas do globo, detendo cerca de 2/3 de todos os satélites em órbita e, deste modo, alcançando um impacto direto universal, bastando para o efeito revermos a influência que tem no desenrolar da Guerra da Ucrânia.

Criou ainda a Neuralink, definida como uma sociedade comercial neurotecnológica, com o objetivo de inserir “computadores” em humanos, com interfaces implantáveis entre o cérebro e computador (ICs) implantáveis. A ideia, que antes só tinha sido vista nos filmes de ficção científica, foi desenvolvida inicialmente para melhorar a vida de um número limitado de pessoas que sofriam de problemas estruturais de saúde – mas, cada vez mais, começa a assentar num contexto de unir Homem e Máquina num só corpo, abrindo uma “caixa de pandora” que se torna impossível de prever como pode terminar.

Para além de todas as polémicas, Elon Musk é, indiscutivelmente, uma das figuras da Inteligência Artificial, não só por ser o criador fundador da OpenAI, hoje a maior empresa do mundo do setor, mas também pela forma como desenvolve esta tecnologia de forma transversal nos vários negócios.

Mas, apesar de tudo isto já o tornar uma presença constante nos media, é a partir da aquisição do Twitter – que transformou em X – e da mais recente ligação com Trump, que se tornou omnipresente em todos os meios de informação e em todas as redes sociais – também nos WhatsApp e similares – numa época em que estes canais são verdadeiros amplificadores de propaganda e agentes de informações, verdadeiras ou falsas.

E é aqui que me parece interessante avaliar esta hipótese de que o que está a acontecer a Musk e a todos nós pode ser a origem e o resultado, simultaneamente, num círculo vicioso interminável que também é assustador.

É sabido que, propagandeando a defesa da liberdade de expressão, Musk alterou o algoritmo do X, mas ninguém sabe exatamente como passou a funcionar. Sendo certo que o modelo circular de alimentar e fornecer mais e mais informação sobre tudo o que aparentemente parecemos “gostar” estar mais potenciado do que nunca. Consumimos aquilo que aparentemente mais gostamos, sem parar.

Ora, se juntarmos o facto de Elon Musk ter uma base de seguidores impressionante – mais de 212,4 milhões de pessoas na última vez que visitei a página dele no X – que agiganta este algoritmo que foi alterado de forma a propagar e a dar tração aos assuntos mais quentes que escolhemos, chegamos a este natural efeito explosivo e contaminante: o próprio parece estar a sofrer dos efeitos supostamente negativos das redes sociais de que todos nós, comuns mortais, também somos alvo. Dos efeitos “filter bubble”, na designação de Eli Pariser, que se referem ao facto de os algoritmos se basearem nos comportamentos passados do utilizador para lhe fornecer mais informação desses mesmos assuntos, limitando a exposição a diferentes perspetivas, aos efeitos “echo chamber”, em que as redes sociais apenas nos dão as informações que reforçam as nossas convicções.

O pouco tempo que Elon tem disponível é assim “ocupado”, por um lado, a partilhar posts que recebe sempre e cada vez mais sobre os mesmos assuntos e as ideias que o algoritmo identifica pela “past history” do feed da sua página no X – e, por outro lado, a publicar os seus próprios posts sobre os mesmos temas e com as mesmas convicções – com todos eles a seguirem para milhares de utilizadores. Tudo isto, num efeito circular exponencial que acaba por radicalizar ideias originais com que poderia, no início, apenas, simpatizar, tornando-se, talvez involuntariamente, num ainda mais radical defensor dessas mesmas teorias, muitas delas altamente radicais e conspirativas.

Ou seja, o receio que temos de que este efeito circular das redes sociais esteja a retirar o “livre-arbítrio” individual e a contagiar os nossos filhos, familiares ou amigos – e a nós próprios –, limitando a informação que temos e que depois “repostamos”, estende-se também a Elon Musk, alegada vítima do seu próprio algoritmo. O problema é que estamos a falar de uma pessoa sem limites financeiros, já com uma capacidade de comunicação extraordinária – e, agora também, com um extremo poder político a nível mundial.

Não parece ser muito promissor, pois não?