Entre Outubro de 2021 e Abril de 2022, as circunstâncias não se poderiam ter alterado mais. A inflação de Setembro, conhecida aquando da apresentação da proposta de Orçamento para 2022, era de apenas 1,5%, e o governo previa que abrandasse para 0,9% no ano seguinte.

Entretanto, este indicador subiu para 4,2% em Fevereiro e 5,3% em Março. Esta aceleração dos preços precedeu a intolerável invasão da Ucrânia pela Rússia, tendo-se agravado desde então, para além de ter havido uma deterioração das perspectivas económicas a nível internacional.

No plano orçamental, no Outono, o défice estimado para 2021 era de 4,3% e o almejado para 2022 era de 3,2% do PIB, enquanto a dívida pública deveria baixar para 122,8% do PIB.

A guerra veio agravar outros sinais negativos que já se verificavam (dificuldades nas cadeias industriais e novas vagas de pandemia). Perante este cenário, o natural é que o governo se empenhasse em exercer uma das suas três principais funções económicas: a estabilização económica (as outras duas são a redistribuição de rendimentos e a regulação dos mercados). Assim, a política orçamental deveria tentar contrariar esta desaceleração e socorrer os mais prejudicados pela subida de preços.

O próprio executivo reconhece uma revisão em baixa das perspectivas para 2022: o PIB só deverá crescer 4,9% em vez de 5,5% e a inflação deverá ser de 3,7% e já não de apenas 0,9%. Ambas parecem, ainda, demasiado optimistas, mas usemo-las para avaliar as opções orçamentais.

O défice de 2021 acabou por ser de apenas 2,8% e, ao invés de aproveitar isso para aliviar a meta de 2022, o ministro das Finanças escolhe uma quase idêntica diminuição do défice, para 1,9%, mas mais gravosa, devido ao contexto.

Se este esforço orçamental fosse fruto de ganhos de eficiência seria de aplaudir, mas não é o caso, pelo que a política orçamental não estará a evitar a desaceleração económica, mas a agravá-la. O mais estranho é a forma como isso é feito. As tabelas de IRS são deixadas intactas face à proposta anterior, quando a inflação prevista era muito inferior, o que resulta num agravamento do imposto sobre as famílias.

Quando, ainda por cima, a inflação vai já diminuir o poder de compra que, assim, acaba por cair por estas duas vias. Os apoios anunciados são demasiado escassos e restritos para compensar estas perdas, que são generalizadas.

O pacote de ajuda desenhado para lidar com as consequências do conflito militar é, no essencial, a reciclagem de fundos anteriormente dirigidos a lidar com a pandemia, pelo que, também aqui, não há um genuíno novo auxílio à economia e às empresas.

Em resumo, temos um orçamento que não apoia a economia quando isso era mais necessário e, ainda por cima, quando até havia alguma margem para o fazer, dados os melhores resultados de 2021.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.