António Perez Metello, nos idos anos 90, gostava de mencionar o que ele chamava de “efeito Lilliput” que mais não era que o choque causado pela então futura entrada no euro, um efeito pelo qual nos veríamos confrontados com a pequenez das nossas coisas e como nos sentiríamos ridículos porque uma bica cá custaria 25 cêntimos enquanto em Paris nos cobrariam uns saudáveis cinco euros. Se éramos pobres, mais nos sentiríamos, impossibilitados de pagar cafés a “um conto de réis” ou táxis a “dois contos”.

Contrariamente ao “efeito Lilliput”, o euro mergulhou o país numa falsa sensação de riqueza. Podíamos viajar pelo estrangeiro e, embora pagássemos mais caro, a coisa resolvia-se bem, ir a Paris era “caro”, mas não incomportável. Em vez de Lilliputianos, éramos todos Gulliver. Para quem podia, ir ao Brasil era uma barateza… nas ruas, nas casas, nas empresas, o euro “empoderou-nos”, pôs-nos ao nível dos mais ricos, entrámos para o clube dos “países desenvolvidos”, sobretudo no acesso ao consumo de coisas importadas.

E o paradoxo continua. Um país falido como Portugal paga menos juros pela sua gigantesca dívida externa que os EUA, a Coreia do Sul, a Austrália ou o Canadá. O que equivale a dizer que um jovem casal português, com a casa hipotecada paga menos pelo empréstimo bancário que os filhos de Bill Gates ou Warren Buffet nos EUA. Isto é literalmente verdade.

A situação é absurda e é tornada possível porque, quer a Alemanha queira, quer não, os nossos prestamistas sabem que, na realidade, estão a emprestar-nos dinheiro sob o guarda-chuva alemão, holandês, luxemburguês e outros probos países que têm copiosos superavits fiscais e comerciais e nos convenceram a entrar para o seu clube com a condição que lhes compraríamos tudo a eles e só a eles, e que tudo o que lhes comprássemos era com uns dinheiros emprestados pelos bancos deles, aos nossos bancos e a nós próprios.

Um dia, a maré baixou, e logo se viu quem estava a nadar sem calções. Exigiram que pagássemos tudo, com mais empréstimos deles, às taxas de juros deles e, se não tínhamos como pagar, toca de vender o pouco que havia, até os postes e os cabos de eletricidade foram ao prego. A banca, o transporte aéreo, os correios, a eletricidade e o petróleo, as comunicações, foi tudo à vida.

No lustre que precedeu a entrada no euro, a economia portuguesa cresceu sempre acima dos países da zona euro. É importante saber os números referentes à taxa de crescimento de Portugal e da zona euro (Pordata). Entre 1996 e 2000, Portugal cresceu 3,5, 4,4, 4,8, 3,9 e 3,8%. A zona euro cresceu, nos mesmos anos, 1,6, 2,6, 2,9, 3,0 e 3,8%. Dito de outra forma, nesse período a economia portuguesa cresceu 22,1% e a zona euro apenas 14,7%.

Desde o ano 2001 que Portugal nunca mais o conseguiu. Nunca. Todos os anos, fomos pedindo mais e ficando mais pobres, pois havia que pagar o muito que pedíamos emprestado para, simplesmente, consumir ou mal investir.

Em 2017, a coisa mudou. Nos dois últimos anos, e também em 2019, Portugal crescerá acima da zona euro  Mas a semente continua a germinar. Não somos competitivos sem a “desvalorização interna”, ou seja, a baixa contínua dos salários. A não ser no Turismo e no que se lhe associa, como os reformados fiscais e os “digital nomads” que têm o computador como enxada e se contentam com sol e surf, e compram as nossas casas, Portugal não é competitivo em matéria nenhuma.

Muitos culpam o euro. Para se pagar com um cartão de crédito de ricos, é preciso sê-lo. O euro é isso mesmo: um cartão de crédito com um plafond altíssimo, que nos é permitido aumentar quando queremos, desde que não fiquemos sem trabalho e o emissor aceite. Em 2009, ficámos sem trabalho e o banco recusou-se a aumentar o plafond.

O remédio é, obviamente, passar de empregado a empresário e de comprador a vendedor. Se conseguirmos reeditar no resto da economia o que, por sorte ou saber, conseguimos fazer no Turismo, talvez um dia lá cheguemos. Até lá “Euro meu, euro meu, haverá alguém mais belo que eu?”… E, do fundo da bruma histórica, uma voz sussurrará “numa casinha de pedra  humilde, vive um velhinho chamado escudo…”.