Que caminhos deve a União Europeia percorrer para concorrer de igual para igual com os Estados Unidos e a China no desenvolvimento da inteligência artificial (IA)?
Para este que é um dos mais importantes debates da atualidade, há uma resposta frequente: é necessária a desregulação da tecnologia. Porém, como demonstrou Anu Bradford, é falsa a escolha entre inovação e regulação digital. O atraso europeu relativamente aos Estados Unidos explica-se por outros fatores: a ausência de um verdadeiro mercado único digital europeu, que torna difícil às empresas escalar; a fragmentação dos mercados de capitais, que limita o financiamento da inovação; uma cultura avessa ao risco, que estigmatiza o insucesso; a incapacidade de atração de talento global.
A existência de regulação digital não é, pois, um bloqueio da inovação. Mas certos fatores ligados à regulação que podem constituir um travão ao desenvolvimento tecnológico e à sua aplicação. Isto mesmo foi reconhecido nos relatórios Draghi e Letta, que preconizam uma simplificação do quadro regulatório europeu, especialmente pelo que toca às pequenas e médias empresas, especialmente às startups.
A Comissão Europeia sentiu a necessidade de dar passos substanciais no sentido de tornar a Europa um player competitivo à escala global. Lançou em janeiro a “Bússula para a Competitividade”, propondo-se, designadamente, reduzir a burocracia, através das propostas Omnibus, eliminar obstáculos ao mercado único e promover a União da Poupança e dos Investimentos.
Em abril, foi lançado o Plano de Ação para o Continente da IA, no qual se prevê investimento em infraestruturas (fábricas e gigafábricas de IA, desenvolvimento da computação em núvem e IA), uma estratégia para a União dos Dados (fomentando a sua partilha e aproveitamento), atrair e qualificar talentos em IA, acelerar a adoção da IA em setores estratégicos e facilitar a aplicação do Regulamento de IA (AI Act).
Já em maio, a Comissão propôs medidas de simplificação destinadas sobretudo às pequenas e médias empresas, que incluem uma alteração do RGPD relativamente à manutenção de registos para empresas com menos de 750 trabalhadores.
Ainda em maio, a Comissão lançou a estratégia “Choose Europe”, dirigida a atrair startups e scaleups.
O que falta? Concretizar todas estas medidas, sem pôr em causa a proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos pela regulação digital, e aproveitar a crise nas universidades americanas para atrair investigadores internacionais.
Falta, sobretudo, aquilo que tem abundado nos Estados Unidos: financiamento em larga escala, através de capital de risco, mas também de fundos públicos. A centralidade que a Defesa hoje ganha na Europa pode ser uma das oportunidades para a afetação de recursos públicos para a investigação e desenvolvimento em IA.