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Ex-funcionária da Facebook acusa empresa de mentir sobre combate ao discurso de ódio

Frances Haugen disse que os milhares de documentos que recolheu e partilhou com o “Wall Street Journal” e com a polícia dos EUA revelam que a empresa mentiu ao público quando afirmou que estava a fazer progressos significativos contra o ódio, a violência e a desinformação.
4 Outubro 2021, 13h14

Frances Haugen, ex-funcionária da Facebook acusou a empresa de colocar lucro acima do bem público, após se apresentar como a denunciante que partilhou um conjunto de documentos internos que colocaram a dona da rede social mais popular do mundo na sua pior crise desde o escândalo Cambridge Analytica.

Entrevistada durante o programa ’60 Minutos’ da “CBS” Frances Haugen disse que os milhares de documentos que recolheu e partilhou com o “Wall Street Journal” e com as autoridades norte-americanas revelam que a empresa mentiu ao público quando afirmou que estava a fazer progressos significativos contra o ódio, a violência e a desinformação.

“A única coisa que vi no Facebook repetidamente foi que havia conflitos de interesse entre o que era bom para o público e o que era bom para o Facebook. E o Facebook, repetidamente, escolheu otimizar para os seus próprios interesses, como ganhar mais dinheiro”, disse Haugen.

Haugen explicou a sua decisão de falar sobre o funcionamento interno do Facebook, por se sentir “alarmada” com as políticas da empresa que davam prioridade ao lucro em relação à segurança pública. “A versão do Facebook que existe hoje separa as nossas sociedades e potencia violência étnica em todo o mundo”, acrescentou a denunciante.

A ex-funcionário afirmou que foi recrutada para ingressar no Facebook como gestora de produto na sua equipa de integridade cívica em 2019, após passar mais de uma década a trabalhar na indústria da tecnologia, incluindo na Pinterest e na Google.

Haugen disse que  aceitou o emprego apenas se pudesse trabalhar para ajudar a empresa a combater a desinformação, fazendo questão de sublinhar que o problema era algo pessoal para ela, depois de ter perdido um amigo depois deste se envolver em “conspirações online“.

Mas desde cedo percebeu que o Facebook “não estava disposto a tomar as medidas necessárias para resolver esses problemas, embora tivesse as ferramentas”. Após dois anos na empresa de Zuckerberg, decidiu demitir-se em maio deste ano.

“Ninguém no Facebook é malévolo”, disse Haugen ao ’60 Minutos’. Ela disse que Mark Zuckerberg, fundador e presidente-executivo do Facebook, “nunca se propôs a fazer uma plataforma odiosa”. Mas, disse ela, os efeitos das escolhas da empresa foram graves.

O Facebook provou que pode fazer mais para resolver esses problemas quando mudou as políticas de conteúdo por várias semanas em torno das eleições de 2020 nos Estados Unidos, disse ela, acrescentando que a empresa deliberadamente deu menor prioridade ao conteúdo político no seu feed de notícias.

Mas a plataforma voltou a usar algoritmos antigos que valorizavam discussões, afirmou, uma medida que diz ter contribuído para o motim de 6 de janeiro no Capitólio. O Facebook também dissolveu a equipa de integridade cívica logo após a eleição.

“Assim que a eleição acabou, eles rejeitaram-nos ou alteraram as configurações de volta para o que eram antes, para dar prioridade ao crescimento sobre a segurança. Pessoalmente, vejo isso como uma traição à democracia”, disse Haugen.

Referindo-se à mudança de algoritmo, Haugen acrescentou: “O Facebook percebeu que se mudarem o algoritmo para ser mais seguro, as pessoas passarão menos tempo no site, clicarão em menos anúncios e [o Facebook] ganhará menos dinheiro”.

A denunciante foi chamada para testemunhar perante o Congresso norte-americano sobre os estudos e outras informações que reuniu durante o seu tempo no Facebook. Ela também aparecerá na frente de parlamentares britânicos e colegas numa data não ainda por divulgar, após o comité conjunto que analisa o projeto de lei de segurança online, que impõe um dever de cuidado às empresas de redes sociais para penalizar utilizadores que promovam conteúdo “prejudicial”.

Em 2019, o Facebook foi multado em 4,2 mil milhões de euros pela Comissão Federal de Comércio dos EUA por “enganar” os utilizadores sobre a sua capacidade de manter as informações pessoais privadas, após uma investigação de um ano sobre a violação de dados da Cambridge Analytica, onde uma análise do Reino Unido revelou que a empresa recolheu milhões de perfis de eleitores norte-americanos no Facebook.

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