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Valor das exportações de bens será superior ao pré-pandemia, antecipa Brilhante Dias

Com os serviços em stand by, “Portugal está a recuperar mercado internacional e a ganhar quota na exportação de bens”, diz Brilhante Dias. Não será o melhor dos mundos mas é um bom (re)começo.
20 Novembro 2021, 18h30

Com as exportações a constituírem um suporte fundamental do crescimento da economia portuguesa, os anos mais recentes foram de forte desafio. E se a pandemia é claramente o elemento com mais forte impacto – o que sucedeu de uma forma geral em todas as geografias, querendo isso dizer que as suas metástases não influenciaram de forma determinante a capacidade concorrencial das economias – outros fatores tiveram igualmente influência negativa.

Desde logo o aumento das matérias-primas, dos transportes e da energia – com os custos associados à produção a dispararem para valores que não eram imagináveis apenas algumas semanas antes. Mas também um ambiente internacional que repentinamente pareceu desfavorável à globalização da economia – patrocinado pela maior economia do mundo e numa altura em que nada o fazia prever.
Apesar disso, e segundo os dados mais recentes usados nesta entrevista ao secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias, as exportações portuguesas estão a responder de forma favorável aos desafios do ‘destrambelhamento’ internacional. Necessariamente a duas velocidades: os serviços (principalmente o turismo) não podia estar a recuperar da mesma forma que os bens transacionáveis, num quadro em que a pandemia impactou de forma muito violenta uma área que estava a ser um suporte efetivo (e até 2019 aparentemente duradouro) do crescimento económico.
Mas Brilhante Dias – que se tem multiplicado no acompanhamento das empresas e dos sectores que estão a testar a sua capacidade de regressarem ao estrangeiro – chama também a atenção para o investimento direto português no estrangeiro, que está em níveis muito positivos.

Se a pandemia não voltar a impor os seus rigores anteriores – e os dados mais recentes, nomeadamente na Europa, não podiam ser mais inquietantes – as exportações continuarão a ser um dos motores do crescimento da economia portuguesa.

Que expectativas tem para o fecho das exportações nacionais até ao final deste ano?
As expectativas são de alcançarmos um valor de exportações de bens já superior ao valor de 2019. Comparativamente a 2019 (janeiro a setembro) as exportações cresceram 4,8%.
Significa que estamos efetivamente a recuperar mercado internacional e a ganhar quota na exportação de bens.
Temos assistido a um comportamento muito favorável em mercados muito relevantes para as nossas exportações bens: Espanha a crescer mais de 25% face a 2020, França 15% e Alemanha 10%; Espanha, o nosso principal mercado de exportações, já está mesmo com níveis de comércio de bens superior a 2019.
No total (bens e serviços), não será ainda expectável que voltemos aos valores pré-pandemia: as exportações de serviços ainda estão cerca de 30% abaixo dos valores de 2019, o que significa que as nossas exportações globais estão cerca de 6% aquém dos valores de 2019.
Como é sabido, esta pandemia afetou todos os sectores em geral, mas de uma forma muito assimétrica, sendo o turismo e o transporte de passageiros dos mais afetados.
Com o avanço dos processos de vacina e um abrandamento da situação pandémica global, os consumidores começam a ganhar mais confiança, pelo que a nossa expectativa é que 2023 possa ser o ano de recuperação dos valores pré-pandemia.

Quais os sectores que melhor responderam, na área das exportações, aos desafios da pandemia e às alterações daí decorrentes?
Em relação à natureza dos sectores, os que foram mais impactados e que ainda não conseguem dar a resposta desejada (apesar da capacidade instalada) são naturalmente aqueles que estão mais sujeitos ao contacto social: o turismo, a restauração, a cultura, os transportes, mas também a moda (vestuário e calçado), por exemplo.
Mas o controlo da pandemia e a implantação de medidas de confinamento, abalou estruturalmente as cadeias de valor provocando atrasos na entrega de produtos (em diversos elos da cadeia desde as matérias-primas ao produto final), mas também tornando visível que a dispersão geográfica das cadeias de abastecimento tinha ido longe demais. Esta última situação, resultou no aumento de preços, em resposta aos choques no lado da oferta.
Mas as cadeias de valor foram ainda afetadas pelo reforço significativo da dinâmica dos processos de digitalização dos negócios que já estavam a ocorrer. O comércio on-line passou a ganhar uma importância acrescida como canal direto e eficaz para chegar ao consumidor final, reduzindo ainda mais as barreiras entre países e mercados.

A pandemia alterou de alguma forma a geografia das exportações portuguesas? Que mercados cresceram com a reabertura do comércio internacional? E quais os que encolheram?
Com o eclodir da pandemia não houve alteração das geografias de destino das exportações de bens. Contudo, é importante salientar que houve um aumento da quota de mercado de 1,8% na União Europeia, muito por força do aumento do desempenho no mercado espanhol e francês.

A reindustrialização da Europa pode afetar o bom desempenho das exportações? A reindustrialização é também o caminho certo para Portugal?
A reindustrialização da Europa pode gerar um redesenho da cadeia de abastecimento com localização ou relocalização de algumas operações na periferia da União Europeia.
Esse facto pode contribuir para atrair investimento direto estrangeiro para Portugal e gerar novas oportunidades de exportação para o mercado intraeuropeu.
Tudo isto pode, por sua vez, redundar num aumento de quota de mercado e quota de importações da economia portuguesa na União Europeia e, por isso, criar uma boa oportunidade de contribuir para o desenvolvimento da indústria portuguesa.

Que resposta dar por parte da indústria à confluência negativa do aumento das matérias-primas, dos transportes de mercadorias e do preço das energias?
É uma conjuntura difícil gerada pela recuperação e pela assincronia entre os momentos da oferta e da procura.
Esperamos que este desfasamento seja atenuado durante o ano de 2022 e recuperar a estabilidade dos fluxos de matérias-primas. O governo português continua a acompanhar esta conjuntura sabendo que não afeta exclusivamente Portugal e por isso poderá provocar uma recuperação mais lenta em toda a Europa.

Alguns industriais dizem que o Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) não vai ser usado para a reindustralização, perdendo-se assim uma oportunidade única no segmento industrial. Como responde?
Os 146 projetos das Agendas Mobilizadoras são uma boa ilustração do impacto do PRR.
Vejamos, temos de ter em conta que 40% dos apoios diretos– ou seja cerca de seis mil milhões de euros-, destinam-se a apoiar as empresas, através das agendas para a reindustrialização, promoção das qualificações e competências, promoção da descarbonização da indústria e bio economia, hidrogénio e renováveis e, claro, digitalização.
Acrescentamos aos apoios diretos o conjunto de reformas previstas para a modernização da administração pública, que beneficiarão naturalmente o sistema empresarial.

Quais os sectores que, numa perspetiva de reindustrialização, podem dar melhor resposta a esse novo desafio? Talvez aqueles que já estão organizacionalmente constituídos em cluster?
A clusterização tem estado entre as prioridades do governo. Para promover uma maior agregação, o governo firmou dez pactos para a competitividade e internacionalização, que corporizam um conjunto de iniciativas em áreas como Indústria 4.0, capacitação de recursos humanos, consolidação dos fatores de atratividade externa e internacionalização.
Para além desse trabalho, o processo de clusterização está a ser reforçado por uma maior articulação ou convergência entre o tecido empresarial e os centros de saber, promovendo igualmente a investigação e desenvolvimento na esfera empresarial.

Internacionalizar não se confina, como é evidente, no fluxo das exportações. O que pode dizer sobre a internacionalização da economia portuguesa?
A internacionalização é transversal. Naturalmente, que engloba as exportações, mas também a angariação de investimento direto estrangeiro (IDE), o investimento direto português no estrangeiro (IDPE) e a nossa projeção como país que sabe fazer e faz bem.
Nas exportações de bens e serviços ultrapassámos pela primeira vez, em 2019, a barreira dos 90 mil milhões de euros (93,615 mil milhões de euros), com um superavit de 818 milhões de euros. Mesmo em pandemia, as exportações totalizaram os 74,551 mil milhões de euros (em 2010, eram 54,386 mil milhões de euros).

De notar que estes valores se refletem igualmente no peso das exportações sobre o Produto Interno Bruto (PIB), em 2016, as exportações de bens e serviços representavam 40,2% do PIB.
Em 2019, o peso das exportações no PIB situava-se aproximadamente nos 44%.
Sobre as empresas exportadoras e diversificação de mercados, houve uma evolução igualmente positiva. Em 2014, aproximadamente 12.300 empresas exportavam apenas para um destino.
Em 2018 este número reduziu-se para 10.700, o que indicia uma tendência de diversificação de mercado das exportações e, por conseguinte, um menor índice de concentração em determinados mercados.

Em 2019, o número de empresas exportadoras de bens foi de 21.429, registando crescimento há três anos consecutivos, que mantivemos em 2020.
Até junho de 2021, a posição de stock de IDE era 153,7 mil milhões de euros e o IDPE ascendia a 53,4 mil milhões. O peso do IDE na economia foi de 75,1% no primeiro semestre de 2021 (68,6% em 2019 e 75,0% em 2020), enquanto, no mesmo período de 2021, o peso do IDPE foi de 26,1% (25,3% em 2019 e 26,0% em 2020).
Na captação de investimento, o presente ano 2021 já é o melhor ano de investimento apoiado pela AICEP desde 2009.

Desde janeiro a outubro, foram aprovados incentivos para projetos que globalmente envolvem 1194 mil milhões de euros de investimento, a concretizar até ao fim de 2025.
Em três dos últimos quatro anos, foram sucessivamente registados recordes de investimento apoiado, e sempre superior a mil milhões. A competências do nosso tecido empresarial e de ensino, o ecossistema inovador, a posição geoestratégica, a inserção no mercado europeu ou uso de uma moeda comum, têm captado a atenção de cada vez mais investidores estrangeiros.
A projeções nacionais e internacionais são favoráveis ao nosso crescimento. Mesmo num contexto atípico, os alicerces estão cimentados e acreditamos que no crescimento sólido da economia portuguesa.

Integrar a Secretaria de Estado da Internacionalização no Ministério dos Negócios Estrangeiros e não na Economia pressupõe uma aposta na diplomacia económica. Que balanço faz dos seis anos passados?
O governo é uma equipa, trabalham todos em conjunto. Como já tive oportunidade de referir, as exportações ultrapassaram a barreira dos 90 mil milhões de euros em 2019, aumentou o número de operadores económicos exportadores e exportamos para mais mercados. Angariámos também mais investimento direto estrangeiro, de mais países diferentes.
Isto foi possível pelo trabalho agregador do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em conjunto com os outros ministérios sectoriais, não só a Economia, mas também a Agricultura, o Mar, a Cultura, Ambiente, Ensino Superior ou Trabalho e Segurança Social, entre outros.
A diplomacia económica assume um papel determinante, de ‘avançada’ na frente externa e isso reflete-se nos números.

 

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