O cenário atual dificilmente poderia ser considerado como favorável para os mercados financeiros.

As guerras na Ucrânia e em Gaza estão longe de terminar, enquanto o antagonismo entre os principais blocos económicos e militares mundiais vai crescendo. As taxas de juro estão em máximos de muitos anos e os bancos centrais avisam que a política monetária será restritiva durante mais tempo.

O processo de globalização já teve melhores dias, tal como a força da procura global de bens.

O Canal do Suez, uma das principais vias de transporte marítimo, está muito condicionado. Economias de topo como as da Alemanha, Reino Unido ou China, estão em dificuldades, com os respetivos modelos de desenvolvimento a serem questionados e, nos EUA, o crescimento tem dependido de estímulos fiscais.

Em termos políticos, a situação mundial preocupa. A autocracia e o populismo têm ganho terreno e há ameaças sérias às democracias consolidadas.

A “qualidade” dos dois principais candidatos à Presidência dos Estados Unidos fala por si, num país cada vez mais polarizado em termos de orientação política, valores, rendimentos e oportunidades. Por isso, as eleições de novembro são um evento de risco.

Mas é neste contexto adverso que se observa uma verdadeira euforia nos mercados financeiros.

Muitas das principais bolsas mundiais estão em máximos históricos, com algumas empresas tecnológicas a transacionarem em múltiplos que fazem lembrar a “bolha” do final do século passado. Há outros mercados a ferver como os das criptomoedas e do ouro, ambos com máximos históricos esta semana.

Esta dissonância entre o ambiente geopolítico, económico e monetário, e o comportamento dos mercados dá que pensar.

Por um lado, é plausível cogitar que a aposta em ativos como ações, ouro e criptomoedas reflete receios de instabilidade e desconfiança em relação ao Estado. Nos contextos mais habituais de aversão ao risco, há uma fuga do “privado” para o “público”, mas em cenários mais extremos, é comum a preferência por ativos líquidos e, porventura, mais independentes das instituições estatais, numa passagem de “público” para “privado”.

Outra explicação possível, talvez complementar, é que a sociedade está num momento de “FOMO” (medo de perder as oportunidades), que propicia atitudes mais especulativas. Nesse sentido, boa parte do que se vai vendo nos mercados poderá ser uma exuberância irracional que, inevitavelmente, terá o seu choque com a realidade.