Meia dúzia de almas caridosas e a generalidade da comunicação social lusa receberam com enlevo, e alguns mesmo com entusiasmo, a eleição de Centeno para chefe dos ministros das Finanças do Eurogrupo. Haverá aqui, é certo, um pouco daquela expressão patusca do nosso “nacionalismo” que se alegra por ver um português nas televisões e nos jornais do mundo. A verdade é que não troco um estrangeiro com qualidade por um português assim-assim.

Não é o caso de Centeno que as terá (qualidades, é claro), sobretudo de natureza técnica, e no trato vende simpatia. Li na imprensa europeia que terá aqui funcionado o lobby de Harvard, universidade em que o nosso compatriota se doutorou. Não discuto a credenciais académicas porque não é isso que está em causa. Essas medalhas não contam rigorosamente nada quando se entra na política.

Mário Centeno, de quem nós nunca ouvíramos falar, decidiu abandonar o Olimpo universitário e o não menos olímpico Banco de Portugal, onde só os seus pares lhe poderiam pedir meças, para se dedicar a mandar nas finanças do povo português. E, aqui, porque vivemos em Democracia, ninguém escapa ao escrutínio e todos, sem excepção, estão habilitados a formular a sua opinião. E, para mim, o ponto é simples: as qualidades políticas do ministro, e só isso interessa, em nada abonam a sua eleição para o Eurogrupo, quaisquer que tenham sido os jogos políticos subjacentes à escolha.

Diz-se do milagre económico entre nós sob o lema “afinal havia alternativas à austeridade”. Alguns jornais estrangeiros, como o El País, falam do governante “crítico da austeridade”. Tudo isto é uma falácia. Pior, é uma falácia sem nenhuma virtude atenuante. Como já toda a gente entendeu, a evolução positiva dos indicadores económicos actuais (a fazer fé neles, não vá aparecer aí algum Andreas Georgiou) deveu-se basicamente ao dinheiro barato do Banco Central europeu e ao Turismo.

Mas a austeridade ainda não saiu daqui, como podemos constatar ao fim do mês na parte do recibo do vencimento que reflecte a dedução fiscal. De mistura, a situação da dívida pública disparou para altitudes nunca vistas e a despesa do Estado, sobretudo com pessoal, pesa cada vez mais. Neste contexto, só um fantasista dirá que os méritos do ministro das Finanças nestes dois anos de mandato justificariam o prémio que agora todos aplaudem. E muito menos com a lapela do “campeão da anti-austeridade”. Porque, se foi esse o argumento, um mínimo de memória quanto ao que se passou nos últimos seis anos deixará todo o Eurogrupo muito mal na fotografia. Mas mesmo que reconheçamos o contributo do Ministro nos tais indicadores económicos aparentemente positivos, não há nenhuma virtude nisso a partir do momento em que Centeno esquece ou denigre a gestão dos seus antecessores.

Sem a política de austeridade do governo Passos Coelho, que salvou o país da bancarrota (é necessário repetir isto mil vezes), não haveria sequer lugar para a falácia de Centeno…

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.