Dois anos após a tragédia de Pedrógão Grande e dos incêndios que devastaram vários concelhos da região centro, o país voltou, por estes dias, a conhecer o inferno das chamas. Mação (com cerca de 95% da sua área de floresta ardida no espaço de dois anos), Sertã e Vila de Rei foram até agora os mais atingidos, sendo que só num concelho um dos incêndios consumiu quase dez mil hectares, o equivalente à área ocupada pela cidade de Lisboa. Já para não falar que a área ardida é quase toda ela de floresta que estava em fase de regeneração, com árvores abaixo dos cinco metros.

Falamos de uma situação de catástrofe à qual o Governo respondeu com um ataque cerrado às autarquias. Primeiro-ministro e ministro da Administração Interna não perderam tempo a responsabilizar os autarcas pela ineficácia no combate aos incêndios e na proteção civil nos seus concelhos.

Na verdade, a quem surpreende que, perante falhas graves do Estado que atingem os cidadãos mais indefesos, o Governo se apresse a atirar culpas a terceiros?

A realidade demonstra-nos, porém, que o Estado voltou a falhar na prevenção e no combate aos incêndios, voltou a deixar populações desprotegidas e entregues à sua sorte, voltou a não garantir eficiência nos meios de combate aéreo e no terreno. E continua sem castigar exemplarmente os incendiários.

Apesar do Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) se encontrar agora na esfera pública e das mudanças na orgânica da Proteção Civil com mais equipas permanentes, Portugal continua a arder e os portugueses continuam a perderam casas, terrenos e negócios.

Dois anos após os fogos que custaram a vida a mais de 100 pessoas, e que fizeram arder mais de 500 mil hectares, o Estado culpa autarcas e responsabiliza proprietários agroflorestais por não cumprirem normas absurdas de limpeza quando o que se esperava dele seria uma verdadeira revolução no combate aos incêndios, nomeadamente, com a criação de uma única entidade responsável pelo dispositivo de prevenção e combate e com um corpo mais profissionalizado.

Em suma, falta comando, falta autoridade, falta profissionalismo, falta firmeza, falta muito Governo numa gestão inteligente da floresta que garanta melhor articulação com autarquias e cidadãos. Felizmente, aos bombeiros não falta coragem para, ano após ano, enfrentarem o horror das chamas para salvar vidas e habitações.