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Feedzai: o unicórnio que nasceu em Coimbra e que será guardião do euro digital

Um dos fundadores da fintech portuguesa trocou a Agência Espacial Europeia por um projeto que tinha como foco o combate à fraude financeira. A aposta revelou-se um sucesso. A avaliação da Feedzai situa-se em 1,7 mil milhões de euros e em 2024 foi responsável pelo processamento de 6,8 biliões de euros.
9 Outubro 2025, 07h00

A Feedzai, fintech portuguesa com origem em Coimbra, dedicada ao uso da inteligência artificial para a prevenção da fraude no sistema financeiro, é um dos unicórnios (termo utilizado para uma empresa privada com avaliação superior a um bilião de dólares ou 850 milhões de euros à taxa de câmbio atual) em ativo em Portugal.

A organização, que viu o seu valor subir para os dois biliões de dólares (1,7 mil milhões de euros), a 2 de outubro, derivados da sua última ronda de financiamento (que atingiu os 75 milhões de dólares ou 63,9 milhões de euros) e que teve como conselheiro legal a Garrigues, é liderada por Nuno Sebastião e Pedro Bizarro, e em 2024 foi responsável pelo processamento de oito triliões de dólares (6,8 biliões de euros), de acordo com a empresa.

Este cartão de visita foi suficiente para convencer o Banco Central Europeu (BCE) a escolher, também a 2 de outubro, a Feedzai como o guardião do futuro euro digital. À fintech portuguesa caberá a responsabilidade de fornecer o mecanismo central de deteção e prevenção de fraude para o euro digital.

“Representando 440 milhões de cidadãos e mais de 17 biliões de dólares (14,4 biliões de euros) em Produto Interno Bruto (PIB), a zona euro é a segunda maior economia do mundo. A introdução do euro digital marcaria a inovação monetária mais significativa na Europa desde o lançamento da moeda única [euro] em 1999. O acordo-quadro [entre BCE e Feedzai] para a componente de gestão de risco e fraude tem um valor estimado de 79,1 milhões de euros e um valor máximo de 237,3 milhões de euros. Em parceria com a sua subcontratada PwC, a Feedzai fornecerá um mecanismo central de deteção e prevenção de fraudes de última geração, garantindo a total conformidade com as normas de segurança, privacidade e proteção de dados da União Europeia (UE)”, dizia o anúncio que confirmava o unicórnio português como o guardião do euro digital.

O CEO da fintech portuguesa considerava que para a Feedzai é uma “honra e responsabilidade” ser selecionada como o primeiro licitante classificado no acordo-quadro para garantir o euro digital.

“Com dezenas de milhares de milhões de transações previstas em toda a zona euro, o sucesso depende de uma inteligência artificial que se adapte tão rapidamente quanto a fraude evolui. O nosso papel é fornecer a inteligência que mantém à distância até as fraudes mais sofisticadas, garantindo a confiança em todas as transações digitais em euros desde o primeiro dia”, acrescentou Nuno Sebastião.

Já a Líder Global de Tecnologia para Crimes Financeiros da PwC, Liviu Chirita, e o Líder de Tecnologia para Crimes Financeiros na Alemanha, Dominik Schauerte, salientaram que o [euro digital] é um dos projetos de infraestruturas digitais “mais importantes” da história da Europa, e uma base para a confiança na era digital.

“Juntamente com a Feedzai e o BCE, estamos a construir as salvaguardas que protegerão milhões de pessoas e empresas. Na PwC, oferecemos a escala, a perícia e o conhecimento regulamentar necessários para garantir esta transformação desde o primeiro dia. Trata-se de mais do que prevenir a fraude, trata-se de capacitar a Europa para liderar com integridade, resiliência e soberania tecnológica”, acrescentaram Liviu Chirita e Dominik Schauerte.

Este ano a Feedzai já esteve também envolvida no lançamento, juntamente com a PwC Brasil, do Centro de Excelência para a Prevenção do Crime Financeiro, anunciou a aquisição da Demyst, com o objetivo de fornecer às instituições financeiras “os dados em tempo real, a análise e a inteligência artificial fiável de que necessitam para tomar as melhores decisões de risco possíveis”.

Em março deste ano a fintech portuguesa anunciou ainda o lançamento de uma sede em Nova Iorque (Estados Unidos).

Tecnologia permite detetar mais fraudes

De acordo com os dados constantes no sítio oficial da fintech portuguesa, a Feedzai refere que ao nível dos bancos de nível 1 (bancos consolidados com capital de elevada qualidade) a sua tecnologia permite detetar 62% de mais fraude, ter menos 72% de falsos positivos, e uma implementação do modelo que é 25x mais rápida.

Entre os investidores da fintech portuguesa estão a KKR, a Sapphire Ventures, a Financial Technology Partners, a OAK, e a Armilar. E conta ainda com parceiros como a Amazon Web Services (AWS), a Deloitte, a EY, a PwC, a Capgemini.

Da agência espacial para a prevenção da fraude

E para quem pense que um background em finanças, ou áreas similares, seria o ingrediente principal da receita do sucesso da Feedzai, sairia bem desencantado. Isto porque um dos fundadores e atual CEO e chairman, Nuno Sebastião, tem um passado ligado à engenharia e à Agência Espacial Europeia, local onde já tomava contacto com várias startups tecnológicas.

No caso de Pedro Bizarro [outro dos fundadores da fintech], tem um doutoramento em Ciência da Computação pela Universidade de Wisconsin-Madison, e colabora com várias instituições de ensino portugueses e internacionais. Aqui inclui-se ser professor visitante convidado na Universidade de Lisboa – Instituto Superior Técnico (IST), professor assistente na Universidade de Coimbra, e ainda professor visitante na Universidade Carnegie Mellon.

É ainda bolseiro Fulbright e membro do Programa Global Innovator do Fórum Económico Mundial.

Este ambiente pode mesmo ter sido um dos gatilhos para que em 2011, Nuno Sebastião se juntasse a Paulo Marques e Pedro Bizarro, para criarem a Feedzai com o objetivo de combaterem a fraude financeira através do uso da tecnologia de machine learning.

“Não somos uma fintech típica. Os nossos fundadores melhoraram as suas competências na Agência Espacial Europeia, enfrentando desafios literalmente de outro mundo. Hoje, canalizamos essa mesma precisão e inovação para proteger o sistema financeiro global. […] Não nos limitamos a processar números, analisamos milhares de milhões de pontos de dados por ano, utilizando modelos baseados em inteligência artificial para detetar e prevenir fraudes em tempo real. Mas não nos ficamos apenas pela fraude. Ajudamos as instituições a atingir a conformidade e a impedir atividades ilícitas, descobrindo o branqueamento de capitais e o crime organizado”, assinala o unicórnio português.

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