Ao ler as notícias desta semana, e a decisão do secretário de Estado das Finanças em suspender as alienações do património da Parvalorem, não pude deixar de me recordar de Luís de Sttau Monteiro e a sua peça centrada na ética e no direito à revolta dos cidadãos. Esteve bem o nosso governante, pois os fundos abutre, de beneficiários efectivos impossíveis de descortinar, mais não fazem do que transferir riqueza nacional para paraísos fiscais.

Dito isto, importa recordar que a Parvalorem pode ser o embrião para uma solução de um problema que se avizinha.

Todos aqueles com alguma experiência no sector financeiro, memória histórica ou estudo, sabem que no decurso das crises, a curva do U invertido do rácio dos non performing loans (NPL) acentua-se de forma dramática, podendo atingir até cerca de 20% da carteira de crédito do sector financeiro.

Antecipar níveis futuros de NPL é crítico para formular estratégia de solução, pois que altos níveis do rácio impactam na solvabilidade dos bancos, restringem a concessão de crédito e a criação de moeda, prolongam estados recessivos e altos níveis de desemprego na economia. E desta vez o turismo não nos salvará como que por artes mágicas.

Portugal, não obstante um sistema financeiro muito desenvolvido, tem tido dificuldade em resolver os NPL resultantes de crises económicas ou financeiras, sendo dos países da OCDE mais lentos na diminuição deste indicador e na libertação de recursos produtivos para as empresas viáveis. A maior capacidade nacional de solucionar os créditos concedidos a empresas zombie ou famílias insolventes, vai estar no cerne da explicação porque umas economias europeias recuperarão mais rápido que outras.

A capacidade para separar os temas de liquidez dos de ausência de viabilidade económica terão que nortear a estratégia de ‘desmame’ das moratórias e das garantias do Estado. As moratórias de crédito e a sua eventual extensão no tempo, as sociedades veículos (bad banks) nacionais ou europeias que libertem NPL, as anormas contabilísticas (a este propósito, será a IFRS-9 catalizadora ou atenuadora de reconhecimento dos NPL?) e a decisão política, formam um sistema integrado.

É vital que a opinião publicada e os decisores políticos se concentrem nesta discussão, que está a ser feita no eixo franco-alemão, sob pena de se prolongar a recessão ou a anemia económica portuguesa. Se alguma coisa aprendemos com as duas décadas perdidas deste milénio, em termos de crescimento económico, é que mesmo com bancos com bases de capital robustas, a não existência de uma estratégia nacional para os NPL condenou toda uma geração ao desemprego e à emigração. Como vai ser desta vez?

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.