Após várias décadas em que a política portuguesa foi bastante previsível, desta vez os eleitores escolheram caminhos de rutura. De facto, não parecem restar dúvidas que teremos pela frente tempos mais animados, ou até imprevisíveis. Eis que, afinal, a nossa suposta excecionalidade deixou de o ser. Agora, tal como em boa parte da Europa, temos partidos populistas, não apenas à esquerda, mas também à direita.
Neste novo contexto, temas há que terão de integrar o centro da discussão e que terão de ser alvo de uma vigorosa oposição, materializada no Parlamento, nos tribunais, ou nas ruas, se necessário.
Sendo muito específico, um dos temas a carecer de outra atenção e de outra mobilização é o das atualizações das reformas e dos salários no sector bancário.
Com os principais partidos a assumirem o compromisso de que cumprirão a lei no que toca à atualização dos valores das reformas da Segurança Social, importa realçar o que está a acontecer a quase 40 mil agregados familiares. Cumprir a lei significou atualizações de 8,40% das reformas da Segurança Social em 2023 e previsivelmente algo em torno de 6% para 2024. Isto porque a inflação (IPC) e aumento real do PIB entram na equação que determina o valor, em cada ano, desta atualização.
Acontece que vários bancos têm estado a apropriar-se, de forma injustificada, de parte substancial destes aumentos, mormente da componente que excede os valores acordados em negociação coletiva (4,5% em 2023 e, para já, uma proposta escandalosa de 2% para o ano em curso).
Como em tempos já escrevi, o ressarcimento dos bancos quanto à atualização das pensões deve ocorrer até ao limite da respetiva responsabilidade de atualização de pensão a cargo do banco. Se o acerto da Segurança Social for superior (em 2023 e 2024 tudo aponta para que seja muitíssimo superior), o excedente deve reverter para o reformado e não para o banco.
Esta apropriação que as entidades patronais estão a fazer é imoral e configura um enriquecimento sem causa. Numa pensão média do sector, podemos estar a falar de mais de 100 euros por mês sonegados por esta via. São dezenas de milhares de euros por cada trabalhador reformado, de acordo com uma expectativa de vida média.
Tenho pena que assim seja. Lamento que a maximização dos ganhos dos acionistas, nos dias correntes, prevaleça sobre a dignidade da pessoa humana, sobre a razoabilidade e sobre a lei. Não tem de ser assim. Não era assim quando entrei para o sector financeiro no início dos anos 1990.
Uma coisa posso, com plena convicção, prometer aos leitores e aos bancários em particular: não cederemos na denúncia desta apropriação sem causa e vamos seguramente reverter esta imoralidade.