(O já habitual ‘disclaimer’: em vésperas de festividades, procurei fugir ao estereótipo das convencionais saudações, prontamente esquecidas a 2 de Janeiro, quando voltamos a vestir a roupagem de quem, afinal, somos o resto do ano. Longe de pretender repetir os votos de paz no mundo e do fim de todas as guerras, centro-me na Ordem dos Advogados. Ainda assim, porque desejo hoje o que desejarei nos demais dias, fica a – minha – esperança de um mundo mais justo. Com a Ordem dos Advogados à cabeça porque – também – é a minha casa.)

 

Contra as expectativas de muitos, Guilherme Figueiredo ganhou a segunda volta das eleições, tornando-se Bastonário da Ordem dos Advogados. Tratou-se de uma vitória digna, principalmente porque foi feita uma campanha negra à volta de si mesmo e de membros da sua lista, alguns dos quais, de uma forma até cobarde, apodados de terem os instintos mais pérfidos para a classe. Como em quase todos os regimes injustos e caducos, tentou-se silenciar as vozes incómodas e granjear promessas junto dos demais, no perpetuar de interesses e de teias típico no último estertor de algo profundamente degradado.

Apesar de quase ter caído no esquecimento, a Ordem dos Advogados tem como principal missão a protecção do Estado do Direito e dos cidadãos, tendo sido, por exemplo, um bastião dos mesmos durante a ditadura. Tem, por outro lado, um relevante papel, de que prescindiu, na qualidade da legislação que a todos nos obriga e, ainda, no que se reporta à concessão de apoio aos cidadãos necessitados que recorrem à justiça.

Nos últimos anos, tal missão foi esquecida e tornou-se, pela mão dos que a dirigiam, pasto para interesses pessoais dos titulares dos respectivos cargos, fragmentando-se toda uma classe por meras estratégias eleitorais ou desejos de protagonismo. Importará não esquecer, entre outras, que foram feitas muitas vítimas, em especial no que se reporta aos estagiários, apanhados num sistema que, deliberada e conscientemente, tinha como principal objectivo não os deixar ser advogados, com vista a, assim, se eliminar a concorrência.  Uma Ordem enfraquecida, longe de ser um mero problema para os advogados, é menos um obstáculo ao poder político, qualquer que ele seja, e menos uma garantia para os cidadãos, ainda que estes possam não se aperceber da sua importância.

A equipa de Guilherme Figueiredo tem, pois, uma pesadíssima herança e, acima de tudo, um gigantesco trabalho a cumprir, essencialmente na reconstrução do caminho que esta instituição deve trilhar. A época presta-se a isso mas, na realidade, a sua eleição não pode deixar de representar um acto de esperança e, em simultâneo, uma exigência (ainda muda) de que façam a diferença. Pela minha parte, não aceitarei menos. Acredito que os demais que em vós tenham votado também não.

Há, de facto, uma lição a retirar de tudo isto: na verdade, mesmo após períodos trágicos, o Sol nasce sempre. Sempre.

A autora escreve segundo a antiga ortografia.