Apesar das dificuldades por que passou a nossa economia nas últimas décadas, setores houve que reforçaram a sua competitividade e assumiram uma clara vocação exportadora. Para além do caso particular do turismo, há a assinalar o notável crescimento das vendas ao exterior dos setores das máquinas e aparelhos, dos plásticos e borrachas, dos produtos agrícolas, do têxtil e vestuário e do calçado, entre outros. São setores de bens transacionáveis que não só têm aumentado a sua capacidade de penetração nos mercados internacionais, como também registam um crescimento do valor acrescentado dos seus produtos.

Os setores do têxtil e vestuário e do calçado, que podemos designar de fileira moda, são exemplares na forma como resistiram a uma mudança drástica do contexto internacional e, consequentemente, dos fatores críticos de competitividade. Até ao final do século XX, estes setores baseavam a sua competitividade, grosso modo, nos preços baixos dos produtos, nos reduzidos custos do fator trabalho, na capacidade de produção em regime de subcontratação e num know-how ancestral.

Ora estes fatores de competitividade deixaram de ser determinantes com a adesão da China à Organização Mundial de Comércio, em 2001, e o alargamento a Leste da UE, que motivaram a entrada nos mercados ocidentais de vestuário e calçado a preços muito baixos. Daqui resultou um movimento de deslocalização industrial para a Ásia e o encerramento de muitas unidades fabris na Europa, situação agravada, no caso português, pela perda de competitividade que a adesão ao euro provocou nos nossos bens transacionáveis.

Neste complexo cenário, as empresas portuguesas da fileira moda tiveram de mudar de vida. Passaram a empregar capital humano mais qualificado, criaram marcas e propriedade intelectual, desenvolveram estratégias de marketing, investiram em produtos de moda e na customização, flexibilizaram as suas estruturas, introduziram tecnologia, apostaram na inovação e na criatividade, agilizaram a distribuição e ganharam capacidade de resposta a encomendas. E, assim, setores com forte tradição e know-how, mas que eram vistos como irremediavelmente obsoletos, ganharam novo fôlego e, hoje, figuram entre os mais exportadores da economia nacional.

Para se ter uma ideia, as exportações de têxteis e vestuário subiram em 2016 mais 5% face ao ano anterior, tendo alcançado os 5,063 milhões euros. Ora o plano estratégico para o setor definia a meta de 5 mil milhões de euros de exportações para 2020, objetivo que foi antecipado em quatro anos. Por sua vez, o volume de exportação de calçado cresceu 3,2% em relação a 2015 (81 milhões de pares), atingindo os 1,923 mil milhões de euros – um novo máximo histórico.

Mas a ambição da fileira moda portuguesa não termina aqui. Os setores do têxtil e vestuário e do calçado estão na linha da frente da chamada indústria 4.0, que decorre da digitalização da economia. A introdução de tecnologias digitais na fileira moda está, por um lado, a alterar a relação com o cliente, designadamente ao permitir o comércio eletrónico e uma maior customização dos produtos, e, por outro, a otimizar os ciclos de produção, com todo o potencial da robótica e da internet das coisas, por exemplo.

É justo referir que esta evolução da fileira moda se deve não só à resiliência e capacidade de gestão dos seus empresários, mas também ao sentido estratégico, visão global e espírito solidário das associações representativas do setor, como a APICCAPS e a ATP. Se me é permitido, refiro também a ANJE que, através do Portugal Fashion, deu um importante contributo à alteração do paradigma de competitividade da fileira moda.

Na semana em que completa 40 edições, em mais de 20 anos de desfiles, é curial salientar o papel do Portugal Fashion na crescente notoriedade internacional da moda portuguesa e na afirmação do made in Portugal como um fator de valor acrescentado.