Com a última fase de desconfinamento, Portugal recomeça a voltar a uma maior normalidade económica e social e a expectativa dos agentes do sector do imobiliário é que este recupere os níveis de atividade, nos diferentes segmentos.
A dinâmica do mercado travou, num primeiro momento, com a pandemia, mas depois acelerou, fechando o ano passado com um investimento total de 2.780 milhões em imobiliário comercial. Este ano tem sido de quebra, de acordo com a 37ª edição do estudo ‘Marketbeat Outono 2021’ da consultora Cushman & Wakefield (C&W), que aponta um investimento de 1.130 milhões de euros para os primeiros oito meses do ano, o que representa uma descida de 40% face ao mesmo período de 2020 e de 29% em relação a 2019. Até ao final do ano, a consultora estima que se atinja a marca dos dois mil milhões de euros, o que significaria uma descida de 27% face a 2020, mas ainda assim, o quarto maior resultado em território nacional.
Em declarações ao Jornal Económico (JE), Paulo Sarmento, Partner e diretor de Capital Markets da C&W acredita que em 2022 os investidores vão continuar a ter “elevados níveis de apetite”.
Olhando para os desafios que se avizinham para o sector, o responsável considera que “as principais ameaças poderão mesmo vir do próprio Estado e da sua contínua interferência negativa no imobiliário”, dando como exemplos as alterações à lei das rendas residenciais, a interferência na relação contatual entre proprietários e lojistas nos conjuntos comerciais, o agravamento do regime do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) para ativos detidos por determinadas classes de empresas ou o englobamento dos rendimentos prediais no IRS.
O novo ano vai trazer também o fim do regime dos Vistos Gold nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto (ver texto neste especial). De acordo com os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), o investimento relacionado com os Vistos Gold caiu 38% no primeiro semestre, face ao mesmo período de 2020, para 237,6 milhões de euros.
Ao JE, Miguel Poisson, CEO Sotheby’s Real Estate, defende que devem “ser mantidos os benefícios fiscais (incluindo toda a costa portuguesa) para investimento estrangeiro (mantendo os dois regimes existentes: Golden Visa e Regime fiscal para residentes não-habituais)”, salientando que para atrair mais investimento para o exterior, “deverá ser seguida uma política de descriminação positiva, ou seja, em vez que acabar com os Golden Visas no Litoral, deverá ser dado um incentivo adicional para o investimento no interior, tanto para empresa (redução de IRC) como para particulares se se fixam no interior (benefícios em sede de IRS, IMT, IMI e/ou outros)”.
O responsável acredita, contudo, que em 2022, Portugal vai continuar a ver entrar investimento estrangeiro, em particular de França, mas também com um forte crescimento dos mercados brasileiro e norte-americano.
Novas políticas na construção
Outro dos grandes desafios no pós-pandemia prende-se com os custos da construção, que segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE) aumentaram 6,6% em julho, devido à subida dos preços dos materiais e o custo de mão de obra, que variaram 8,6% e 3,9%, respetivamente, face a julho de 2020. Ao JE, José Cardoso Botelho, CEO da Vanguard Properties, diz esperar que em 2022 os preços e a oferta desçam, “sendo incerta a magnitude da correção”, realçando a urgência de introduzir políticas que permitam atrair mais mão-de-obra, eventualmente de diferentes países, e um pacote fiscal que atraia o regresso de nacionais. “É confrangedora a notícia que mais de 400 mil portugueses solicitaram a residência no Reino Unido. É crítico o reforço dos capitais das nossas empresas de construção para serem capazes de lidar com o acréscimo da procura, pública e privada”, sublinha.
Ouvido pelo JE, Ricardo Sousa, CEO da Century 21, partilha desta opinião, acrescentando que todos estes fatores têm influência “quer as atividades de reabilitação, quer as de construção nova, e limitam a rotação de habitações, o que não contribui para o aumento da oferta de imóveis usados e para uma utilização mais eficiente do parque habitacional português”.
ESG e construção nova como tendências
O confinamento a que a pandemia obrigou teve o condão de levar os portugueses a olhar com mais cuidado para a habitação, seja para compra ou remodelação. Zonas amplas, varandas maiores, espaços para escritórios, são, por isso, alguns dos requisitos para a construção nova, mas também para remodelações. “Já não é uma opção, é uma necessidade. E as novas gerações de compradores serão bem mais exigentes neste capítulo”, afirma Miguel Poisson. Por seu turno, Paulo Sarmento, frisa a importância dos critérios ESG (acrónimo em inglês para ambiental, social e de governança) na tomada de decisões tanto de investidores como de ocupantes. “Vai dar origem a muitas mudanças: inquilinos que não considerarão ocupar edifícios abaixo de um certo “standard verde”, inquilinos que serão considerados “persona non grata” em certos edifícios pela própria natureza da sua atividade, etc”.
Portugal atrativo para investir
Com o retomar da atividade económica, os responsáveis ouvidos pelo JE confiam que o país continua a ser visto lá fora como atrativo para investir. No entanto, deixam alguns alertas. “Portugal tem um sério desafio neste domínio. Existe uma perceção negativa sobre a falta de estabilidade legislativa e fiscal, justiça lenta e excesso de burocracia, significando isto, morosidade, aumento dos riscos do investimento e, ainda, incerteza jurídica”, realça José Cardoso Botelho, frisando que o imobiliário e o turismo serão “bons investimentos de “refúgio”.
Miguel Poisson considera que é preciso não destruir “os avanços feitos nos atuais benefícios fiscais que atraem investimento estrangeiro. Se há preocupações de branqueamento de capitais ou outros, então deverão ser implementadas mais medidas de fiscalização e não matar a galinha dos ovos de outro que têm atraído muito investimento para Portugal”.
Também Paulo Sarmento chama a atenção do Estado para deixar de estar “constantemente a penalizar o setor com mudanças legislativas e fiscais nada conducentes ao investimento. Temos todas as condições para manter a nossa atratividade como destino de investimento e um mercado cada vez mais rico em participantes, diverso, equilibrado, transparente e líquido”.
Por sua vez, Ricardo Sousa, destaca as regiões do Algarve, Madeira, Açores, Alentejo, Douro, como aquelas que podem tirar maior partido da recuperação do sector do turismo, consolidando “a notoriedade e os níveis de procura já atingidos, nos últimos anos”.
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