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FMI: “O verdadeiro desafio de Portugal é melhorar as perspetivas de crescimento a longo prazo”

Apesar de não traçar um cenário alarmista, David Lipton enumerou os riscos e incertezas globais e disse que “a questão que devemos colocar é se a Europa e Portugal estão devidamente preparados para sustentar o crescimento, evitar outro choque sistémico e reagir ao que quer que venha”.
25 Março 2019, 13h41

O primeiro-vice diretor geral do Fundo Monetário Internacional, David Lipton, disse esta segunda-feira que o principal desafio de Portugal é melhorar as perspetivas de longo prazo, destacando a necessidade de injetar vitalidade no mercado laboral e aumentar a inovação na economia nacional.

Numa intervenção na conferência “Portugal: reform and growth within the euro área”, organizada pelo Banco de Portugal e pelo Fundo Monetário Internacional, em Lisboa, David Lipton disse que Portugal fez progressos consideráveis desde o programa de ajustamento, exemplificando com a redução do desemprego de 16% em 2013, para 7% atualmente, assim como a trajetória de redução do défice. Elogiou ainda o boom das exportações e do turismo, destacando que todos os factores contribuíram para reduzir o perfil de risco de Portugal e aumentar a sua resiliência a choques.

No entanto, apontou que “existe ainda espaço para melhorias”, destacando que a dívida pública continua alta e o setor privado com elevados níveis de endividamento. Apesar de reconhecer progressos significativos na redução do malparado, sublinhou ainda que o sistema bancário continua frágil.

“O futuro de Portugal não é apenas uma questão de fazer face às vulnerabilidades”, disse. “O verdadeiro desafio é melhorar as perspetivas de crescimento a longo prazo, continuando a tarefa de reequilibrar as folhas de balanço”. Para o economista, esta é a receita para que Portugal aumente a produtividade.

“Um importante desafio será injetar uma nova vitalidade ao mercado laboral”, disse, justificando que apesar da descida acentuada do desemprego e da criação de novos postos de trabalho, existem ainda muitos postos de trabalho com o salário mínimo. “O declínio do malparado no setor bancário está a libertar capital que pode ser alocado para responder às necessidades da economia do século XXI”, referiu. “Mas também aqui há um longo caminho a percorrer, porque os índices da NPL continuam altos”.

“O mercado de produtos de Portugal precisa de reformas e o setor empresarial precisa de se reformular para lidar com a próxima onda de inteligência artificial, robótica e e-commerce. O governo pode desempenhar um papel fundamental ao facilitar essa mudança, se continuar focado no esforço de reforma e garantir que a regulação que controla não desencoraja atividades dinâmicas e inovadoras”.

O céu não está a cair, mas há riscos e incertezas a nível global 

O primeiro-vice diretor geral do FMI enumerou os diversos riscos no cenário internacional, que se refletem num menor crescimento a nível global, incluindo na Europa.

“Não estou a dizer que o céu está a cair. Não está”, disse, acrescentando que a maioria das projeções económicas, incluindo as do FMI apontam para uma recuperação na Europa nos próximos trimestres. “Mas estamos a enfrentar riscos crescentes e incertezas. E isso significa que todos os países precisam renovar o seu comprometimento com as reformas que irão suportar o crescimento atualmente, e fortalecer o crescimento potencial a longo prazo”.

“A questão que devemos colocar é se a Europa e Portugal estão devidamente preparados para sustentar o crescimento, evitar outro choque sistémico e reagir ao que quer que venha”, referiu. “Se a Europa vai fortalecer as defesas contra a crise e avançar ainda mais em direção à integração, deve superar as deficiências de política que podem agravar a próxima recessão, sempre que vier a acontecer”.

Realçou, neste sentido, que “as ferramentas utilizadas para enfrentar a crise financeira global podem não estar disponíveis ou podem não ser tão potentes da próxima vez”.

“O espaço para acomodação adicional de política monetária certamente será mais restrito, os recursos orçamentais podem não estar disponíveis em muitos países e a resistência política aos resgates pode ser maior, porque muitas pessoas sentem que aqueles que provocaram a última crise não assumiram a sua parte do fardo”, acrescentou.

No entanto, reconheceu progressos na União Europeia, particularmente o fortalecimento da sua arquitetura institucional, como o reforço do Mecanismo de Estabilidade Europeu.  Ainda assim, considerada que a supervisão bancária continua muito fragmentada e os mercados de capitais ainda estão fragmentados entre as linhas nacionais, o que limita o potencial de partilha de risco.

“Cada país tem a responsabilidade de reduzir riscos e manter ou aumentar o crescimento. Mas numa recessão acentuada, esses limites podem ser testados”, disse. Salientou, no entanto, a importância de uma “regulação e supervisão forte” para minimizar o impacto dos riscos. “Todos os países têm a obrigação de pôr – e manter – a casa em ordem”.

Esclareceu, ainda assim, que o mesmo se deverá aplicar aos Estados Unidos, numa altura em que as tensões comerciais com a China estão a ter um impacto global.

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