Não se pode dizer de ânimo leve que a proposta de Orçamento do Estado para 2023 (OE23) seja “anémica” no que toca ao apoio às empresas. Aliás, seria forçoso que o acordo de rendimentos e competitividade, assinado com as confederações patronais, se viesse a traduzir em vantagens para o lado das empresas, por muito que estas as considerem insuficientes.
Com efeito – e ainda sem ter em conta eventuais ajustamentos que resultem do debate na especialidade – os benefícios fiscais que o OE23 prevê para as empresas têm, em linhas gerais, a ver com a valorização salarial que elas protagonizarem, com o alargamento da taxa reduzida de IRC para pequenas e médias empresas, com a eliminação do prazo de reporte dos prejuízos fiscais, com incentivos ao investimento e, finalmente, com a situação crítica da capitalização das empresas.
De realçar que este último domínio será, talvez, o que virá a ter mais impacto orçamental, relevando a sua importância estratégica, através de deduções à colecta de IRC, em situações de entradas de capital em dinheiro ou em espécie realizadas pelos sócios, situações de prémios de emissão nas participações sociais, bem como situações de aplicação dos lucros retidos a resultados transitados, reservas ou aumentos de capital social.
Pretende-se assim, de alguma forma, robustecer a posição do tecido empresarial no que toca à sua excessiva dependência de capitais alheios, prioridade esta tida como central por parte das confederações patronais.
Apesar destas medidas de incentivo à capitalização das empresas irem no caminho certo, o grande desafio face à exiguidade da base de capital no país com consequências no subdimensionamento e falta de escala empresarial e logo na produtividade média, exige para a sua superação o uso de instrumentos mais “interventivos”, os quais por sua vez exigem mudanças da mentalidade empresarial em geral.
Sendo assim, vamos lá pressupor que as palavras de visão estratégica, cooperação, abertura do capital e inserção em projetos de redimensionamento entrem no léxico habitual das dinâmicas empresariais. Admitamos tudo isto, no contexto da nossa economia.
Então recolocam-se com grande acuidade algumas questões centrais, aliás radicadas na crónica descapitalização de muitas empresas. E elas são:
- Quantas ideias ou projetos, portadores de efetiva inovação e valor acrescentado, não vão adiante por insuficiente base de capitais?
- Quantas empresas que desenvolvem projetos de inegável valor económico com sucesso inicial acabam por ficar asfixiadas –por falta de capital – quando querem dar o salto de crescimento?
- Quantas empresas vivendo em situação de dificuldades financeiras, mas tendo subjacente projetos empresariais com efetiva viabilidade económica se poderão salvar com reestruturações financeiras adequadas?
Tudo tem a ver com o encontrar soluções de “financiamento” para projetos economicamente viáveis e dotados de sustentabilidade ambiental e não para casos de “colocar dinheiro bom em cima de dinheiro mau” que conduz, em regra, à desgraça.
Com efeito já há muito tempo que se encontram ao dispor instrumentos financeiros de capital ou quase capital (vulgo engenharia financeira), susceptíveis de dar resposta às três questões atrás enunciadas. Que alguma das vezes se traduzem em participações de capital minoritárias e temporárias, mas obrigatoriamente intervenientes na condução dos negócios das empresas. E é neste particular domínio que se apela à abertura de espírito por parte da gestão demasiado tradicional de muitas empresas economicamente viáveis (excepção feita, em regra, ao domínio das startups),
No atual momento, e tendo em conta a execução do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, geram-se fortes expectativas quanto à futura acção do Banco de Fomento, a par da intervenção doutros operadores como os de capital de risco, em particular.
Note-se, no entanto, que as instituições vocacionadas para operações de financiamento a médio e longo prazo, bem como de operações típicas da engenharia financeira mais sofisticada, devem em princípio constituir um conforto para a banca comercial em geral (pelo reforço da estrutura financeira das empresas), mas não dispensam o acompanhamento rigoroso por estas das necessidades de financiamento corrente das empresas apoiadas. É que são realidades que se devem complementar, e tem havido alguns indícios no passado de que nem sempre há convergência na acção.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.