Recordo-me de um filme de Wolfgang Peterson – “Fora de Controlo” (1995) – em que o ator Dustin Hoffman desempenhava o papel de médico militar que descobre em África um vírus perigoso. As autoridades militares norte-americanas decidem ignorar o perigo, acreditando que o vírus nunca irá chegar aos EUA. Claro que o vírus arranja forma de sair de África através de um macaco que se torna um elemento vital ao longo do filme para se conseguir alcançar uma cura.

Tenho-me recordado bastante desse filme ao ler as notícias sobre a emergência de saúde global decretada pela OMS, na sequência da epidemia do novo coronavírus que terá sido originado num mercado de vida selvagem em Wuhan, China. Nos últimos dias, as autoridades chinesas anunciaram, finalmente, um fim permanente ao comércio de animais selvagens, com o objetivo de impedir a propagação de zoonoses (doenças dos animais transmissíveis ao homem).

A reação é bastante tardia, sendo que o novo vírus SARS-CoV-2, com transmissão pessoa a pessoa, já provou ser global, com casos registados em mais de 30 países. Sabe-se pouco ainda sobre as características deste vírus, mas sabemos que a infeção se desenvolve de forma semelhante a uma gripe/pneumonia da qual muitos adultos recuperam.

No espaço europeu, o norte de Itália registou um aumento abrupto do número de casos e há preocupações naturais sobre as medidas adequadas a tomar por cada Estado europeu, que irão ver os seus serviços de saúde enormemente pressionados para responder à epidemia.

Em momentos críticos como este são essenciais esforços de coordenação para garantir a proteção de cada Estado-membro. As populações têm de dar ouvidos a especialistas de saúde, mesmo quando muitas medidas possam parecer contraintuitivas. A comunicação social não pode fugir à responsabilidade acrescida de não divulgar desinformação, não semear pânico ou criar sensacionalismo no meio de uma crise de saúde pública. Não faltarão populistas a tentar cavalgar o momento para nos forçar a crer que as respostas dos governantes ou do SNS não estão à altura.

E estaremos preparados para as consequências económicas? Reações demasiado agressivas como as do governo italiano, que impôs quarentena numa das zonas industriais do norte de Itália, podem não se revelar particularmente eficazes na contenção e provocar bastantes danos no ecossistema económico.

Os mercados têm vindo a reagir negativamente e os analistas preveem que uma possível recessão (que já se vislumbrava no horizonte) seja antecipada com o impacto do coronavírus nas comunidades locais. Eventos de grande dimensão (Euro 2020 ou Jogos Olímpicos) poderão ser cancelados, comércio e serviços irão sofrer com as recomendações de isolamento social, linhas de produção em fábricas poderão abrandar ou encerrar e escolas poderão funcionar a meio-gás, tornando mais difícil a vida de muitos pais.

Os esforços têm de ser concentrados nos cuidados administrados aos doentes, na adequada prevenção pelas populações, visto tratar-se de um vírus de alta transmissibilidade. A taxa de mortalidade não é alta, o que é motivo de alívio, mas vem aí um grande teste à capacidade dos serviços públicos de saúde, bem como ao nosso bom senso coletivo para fazer frente a esta crise.