Enquanto aluno do ensino secundário, tive o prazer de ser aluno de uma das referências da Matemática no nosso país, o Prof. José Paulo Viana. Ao jeito dos desafios que, semanalmente, “O Público” nos traz há mais de 20 anos, o Professor tinha a capacidade de fazer os alunos pensar, levando-os além da típica memorização da fórmula a aplicar – uma abordagem demasiado entranhada no sistema de ensino português.

Mas não era só em Matemática que o Professor nos fazia pensar, e foi esse seu sentido crítico que transpareceu num post com que me deparei no fim-de-semana. Demasiado longo para transpor na íntegra, este referia-se ao Despacho Normativo 13A/2012, da autoria do Ministério da Educação – então liderado por Nuno Crato – onde é definida a fórmula de atribuição do chamado “Crédito Horário” – uma carga horária semanal específica a cada escola ou agrupamento, que estas poderão alocar da forma que melhor servir as suas necessidades. Ora, a fórmula apresentada para determinar este crédito de tempos é, à primeira vista, bastante simples: uma soma de três parcelas, uma relativa à eficiência na gestão dos recursos, outra à eficácia educativa e uma última resultante do número de turmas na escola/agrupamento.

O engraçado começa quando tentamos definir estas variáveis: “As variáveis da fórmula mencionada no número anterior encontram-se definidas nos anexos I a IV”, pode-se ler no despacho. Subitamente, o que era uma fórmula com três parcelas multiplica-se numa trapalhada de 25 parâmetros e três tabelas, que até para um professor de matemática se torna confusa.

Mas, se a esta complexidade de cálculo se seguissem resultados aplicáveis, que melhorassem o funcionamento das escolas a nível individual e, por conseguinte, do sistema educativo como um todo, tudo bem; o sistema educativo é uma realidade extremamente complexa, com grandes assimetrias a vários níveis e em que não existe uma fórmula mágica replicável em todo o mundo que gere jovens adultos responsáveis, conscientes e informados (na realidade, uma reforma extensiva do sistema de ensino é necessária, uma que se afaste do sistema de “linha de montagem” e se foque nas capacidades e carências individuais de cada aluno, mas isso seria assunto para muita tinta).

O problema é que, ao aplicar esta fórmula séria e criteriosamente, o resultado final é, muitas vezes, estapafúrdio. A escola que frequentei, e onde lecciona o Prof. José Paulo Viana, por exemplo, perderia horas, visto que esta fantástica formulação gerou um resultado negativo. Mas o melhor ainda está para vir: quando contactado, o Ministério da Educação foi bastante rápido a tranquilizar a escola em causa, garantindo-lhe que teria direito a – pasme-se – dez horas! No fundo, o Ministério é como alguns professores – fazem testes e criam modelos de avaliação para, no final do ano, dar o “10” aos alunos que tiraram negativa.

Recapitulando, o então ministro Nuno Crato e o seu gabinete apresentaram uma fórmula ultra-complexa numa enunciação simplificada que oculta duas dezenas de factores, remetendo-os para os anexos do despacho e, no final de contas, este cálculo é completamente irrelevante – independentemente do resultado da dita fórmula, a atribuição destas horas extraordinárias é um processo aparentemente aleatório. Brilhante. Se este fosse mais um dos conhecidos desafios matemáticos do Professor, acho que saberia como classificar tal fórmula ministerial – um conjunto vazio. Ou, talvez, um fechado composto por [idiota, inútil, ineficiente].

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.