[weglot_switcher]

França: François Bayrou leva hoje o Orçamento a votos sem certeza de sair vitorioso

A comissão mista entre o Senado e a Assembleia Nacional conseguiu engendrar uma proposta orçamental que vai a votos esta segunda-feira. O texto, ou mais propriamente a sua existência, foi aplaudido por vários quadrantes, mas a sua aprovação não está garantida.
Francois Bayrou
French Prime Minister Francois Bayrou arrives to attend a state dinner on the occasion of the Angolan president’s visit, at the Elysee Palace in Paris, France, 16 January 2025. EPA/CHRISTOPHE PETIT TESSON
3 Fevereiro 2025, 07h00

Uma meta de poupança de 50 mil milhões de euros, com a intenção de reduzir o défice de 6,1% em 2024 para 5,3% em 2025. É esta a base que o primeiro-ministro francês, François Bayrou, conseguiu apurar para apresentar aos deputados da Assembleia Nacional – na perspetiva que, finalmente, os franceses possam ter um Orçamento para o ano já em curso. Quais são as diferenças em relação à proposta do anterior primeiro-ministro, Michel Barnier? Praticamente nenhumas – mas agora Bayrou e os franceses têm muito menos tempo, e convém, perante a ‘aflição’ económica de França, que o assunto se resolva.

Tendo o orçamento sido rejeitado no outono pela Assembleia Nacional, a comissão mista (CMP, um organismo criado entre o Senado e a Assembleia onde os partidos têm lugar proporcionalmente aos lugares que ocupam no parlamento) confirmou em grande parte a proposta aprovada em 23 de Janeiro no Senado, uma versão genericamente fiel às propostas iniciais de Michel Barnier, retomadas por François Bayrou, referem a maioria dos comentadores citados pela imprensa gaulesa. Especialmente no que diz respeito à receita.

Na proposta atual ali está o esforço temporário sobre os imposto dos rendimentos das famílias mais ricas (dois mil milhões de euros é o apuro esperado) e a contribuição excecional sobre os lucros das grandes empresas (oito mil milhões). Este esforço limitou-se apenas ao ano de 2025 (Barnier queria dois anos, 2025 e 2026). Outras propostas incluídas no texto são o aumento dos impostos para os automóveis não-elétricos, aumento da tributação sobre recompra de ações e de caldeiras a gás, entre outras ‘minudências’. O aumento para 0,4% do imposto sobre transações financeiras, considerado insuficiente pelo Partido Socialista nos últimos dias, também foi confirmado. Os parlamentares também chegaram a um acordo sobre o aumento do imposto sobre passagens aéreas, que passaria de 2,63 euros para 7,30 euros para uma passagem em classe económica para a França ou Europa, enquanto o governo inicialmente pretendia 9,50 euros. No total, o sistema renderá ao Estado entre 800 e 850 milhões de euros.

O governo Bayrou fez vários cortes nos orçamentos de vários ministérios. Ajuda pública ao desenvolvimento, ecologia, cultura, agricultura, investigação e ensino superior são as áreas mais afetadas. Os cortes ascendem a várias centenas de milhões. O esforço financeiro solicitado às autoridades locais foi estabilizado nos cerca de 2,2 mil milhões de euros. O governo também decidiu não estender o número de dias de licença médica para funcionários públicos para três , mas a taxa de compensação foi reduzida para 90% em vez de 100%.

Vários pontos sensíveis foram também arbitrados pela CMP, nomeadamente sobre o orçamento destinado à assistência médica do Estado (AME), reduzido em 111 milhões de euros relativamente ao orçamento inicial de Michel Barnier, para o manter ao nível de 2024 (cerca de 1,3 mil milhão). Prevista está também a promessa de François Bayrou de restaurar quatro mil cargos no ensino – mas à custa do próprio ‘pelo’: os 50 milhões de euros necessários para essa recuperação serão retirados de outra parte do orçamento da educação. Uma proposta simbólica não passou pelo filtro do CMP: os ex-primeiros-ministros e presidentes acabarão mantendo as suas ‘mordomias’. A emenda que visava retirar privilégios, integrada ao projeto de lei de finanças de 2025 pelos senadores, não foi adotada pela comissão.

O orçamento vai a votos na Assembleia Nacional esta segunda-feira. Mas ainda não é totalmente seguro que passe – e que o governo não tenha de usar o famoso Artigo 49.3 para que a lei geral entre em funcionamento sem votação. Ou seja, Bayrou tem pela frente o mesmo caminho que Barnier: se usar a alavanca do artigo, pode ser que tenha de enfrentar uma moção de censura. E se isso acontecer, pode perder o cargo, mantendo a França num impasse. As incógnitas são muitas, até porque a maioria dos partidos manteve-se durante o fim-de-semana em discussão interna sobre o orçamento. E muitos deles disseram que só tomariam uma decisão sobre o voto em cima da hora.

Seja como for, após catorze horas de trabalho, os sete deputados e sete senadores reunidos na Comissão Mista conseguiram concordar com uma versão comum do Orçamento do Estado para 2025. É esta versão será apresentada à Assembleia Nacional na segunda-feira. A versão divulgada pelo CMP está muito próxima das decisões dos dois líderes da coligação governamental, o senador Jean-François Husson (Les Républicains) e o deputado David Amiel (Renaissance), tendo sido poucas as concessões extraídas pelo Partido Socialista. Do seu lado, os ministros da Economia e das Contas Públicas acolheram com agrado o compromisso alcançado na Comissão Mista, “um passo para permitir que o nosso país avance”.

Segundo a imprensa gaulesa, a ministra responsável pelas contas públicas, Amélie de Montchalin, congratulou-se “com o resultado positivo da comissão mista” e com o compromisso que encontrou sobre o orçamento do Estado para 2025, com vista a “tirar a França do regime de serviços mínimos”. “Gostaria de saudar o resultado positivo do comité conjunto”, disse. O ministro da Economia, Eric Lombard, também acolheu com satisfação o compromisso do CMP. “Este é um passo importante para nos dotar de um orçamento e permitir que o nosso país avance”, escreveu nas redes sociais. O governo ainda pode tomar decisões até segunda-feira, ou seja, até à votação dos deputados – e alterar o texto, mas Lombard assegurou que isso não aconteceria.

A esquerda do La France insoumise está fora e considera que o acordo alcançado pelos parlamentares na comissão mista dá origem a um projeto de orçamento do Estado para 2025 que será “pior que o orçamento Barnier”, disse Éric Coquerel, um dos parlamentares daquela força política. “As receitas caíram 6,2 mil milhões de euros em relação ao orçamento de Barnier” e os cortes orçamentais “aumentaram 6,4 mil milhões de euros” em relação ao plano do anterior primeiro-ministro, calculou o deputado, criticando uma “cura de austeridade sem precedentes” e apelando à oposição para ser “consistente” na censura ao governo de François Bayrou em caso de recurso ao artigo 49.3.

Do seu lado, a extrema-direita de Marine Le Pen e Jordan Bardella vai manter o ‘suspense’ até ao fim: disse este fim-de-semana que só decidirá o seu voto esta segunda-feira.

RELACIONADO
Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.