Há ano e meio, Emmanuel Macron e o seu movimento En Marche alteraram o panorama eleitoral e tomaram conta do poder em França. Um fenómeno que foi visto como a falência do modelo assente nos partidos tradicionais. Partidos que se tinham revelado incapazes para resolverem os problemas com que os eleitores se viam confrontados no dia a dia.

Um descontentamento que explicava o crescente peso social e político da extrema-direita personificada na família Le Pen. Um peso que só não encontra um adequada tradução eleitoral porque o sistema francês é maioritário a duas voltas. Por isso, na segunda-volta, funciona o voto útil e a estratégia “Todos contra a Frente Nacional”.

Malgrado a indefinição ideológica do En Marche, Macron foi visto como alternativa válida para a reconciliação do eleitorado francês com a classe política dirigente. Afinal, o sistema de governo em França é presidencialista e, como tal, mais do que o partido interessa a personalidade que o encabeça.

Como decorre da História, depois de um inicial estado de graça, chega o momento em que os restantes partidos, os sindicatos e as organizações da sociedade civil assumem uma clara postura oposicionista. Daí as críticas à maioria das medidas tomadas pelo executivo. Por isso o subir de tom no que concerne às reivindicações.

Porém, o bloqueio levado a cabo no dia 17 de novembro de 2018 pelos “coletes amarelos” constitui uma novidade. Num país onde é reconhecida a capacidade de mobilização por parte dos sindicatos e dos partidos extremistas, os franceses resolveram dispensar essa intervenção. O protesto teve origem na rede e usou as novas tecnologias para convocar o descontentamento social.

A causa próxima foi o aumento do preço dos combustíveis, mas as reclamações são mais profundas. Prendem-se com a política seguida por Macron e que está longe de satisfazer as exigências da classe média que se vê confrontada com um aumento de impostos e uma redução nas reformas sem que o seu esforço reverta a favor dos mais desprotegidos. Por isso, Macron já é acusado de não ser o presidente da França, mas o presidente dos ricos.

Numa conjuntura dita de normalidade, o bloqueio seria coisa de um ou dois dias, embora o debate se mantivesse acesso durante meses como forma de alterar a política governamental e, concomitantemente, delapidar a imagem pública do Governo. Só que a França vive tempos excecionais e não pelas melhores razões. Uma situação que Macron não conseguiu reverter, apesar dos apelos ao patriotismo que, a exemplo de De Gaulle, fez questão de diferenciar, pela positiva, do nacionalismo.

No ano em que se comemora meio século sobre o Maio de 68, os manifestantes já estão informados sobre o aproveitamento político que foi feito de um protesto inicialmente estudantil. Por isso, há quem alerte para a necessidade de não repetir os erros desse passado.

Um alerta que, no entanto, não parece suficiente para que os franceses resistam às vozes populistas que, em nome de um pretenso interesse nacional, escondem motivações que decorrem de uma agenda própria.

Afinal, Macron, com a sua política de favorecimento da elite, tornou-se adjuvante do populismo. A fatura não demorará a chegar.