A Ordem dos Advogados, que elege o seu Bastonário no dia 18 de Novembro, está a passar por um lento processo de transformação. Durante muitos anos, os advogados trabalhavam todos por conta própria em pequenos escritórios. Essa unidade permitiu que a Ordem fosse dirigida por uma elite. Hoje existem, a par com os pequenos escritórios, centenas de advogados a trabalhar para sociedades e advogados que são empregados de empresas. Trata-se de realidades muito diferentes entre si porque a relação do advogado com o cliente, o exercício da profissão como actividade liberal, é totalmente distinta.
Esta discrepância de realidades fragilizou a Ordem e explica alguma da crispação existente. Explica a maior agressividade dos últimos anos e uma certa confusão entre o que deve ser uma associação pública profissional e o que é um sindicato. A diferença entre os vários modos de exercer a profissão, seja na prática individual, seja como contratado das grandes sociedades ou integrado nas empresas, está a criar divisões que, caso não haja cuidado, poderão conduzir uma cisão na Ordem.
Em Junho, João Afonso Fialho, presidente da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal, disse numa entrevista ao Jornal de Negócios que “a Ordem não tem interesse nas sociedades de advogados”. Dada a diversidade mencionada em cima a suas palavras soam a uma queixa sobre a dificuldade da Ordem representar todos os tipos de exercício da profissão.
O mal-estar instalado, a necessidade de a Ordem se fazer valer, obriga esta a ser mais activa e mais crispada. A restrição do acesso à advocacia, a redução da concorrência, o desrespeito gradual das regras deontológicas, são outros sinais de desadaptação aos novos tempos.
A imposição de regras de acesso à advocacia, defendidas por todos os candidatos à Ordem dos Advogados, deve-se ao receio da concorrência e substitui o mercado, ou seja os clientes, na livre escolha de quem os pode representar. O regime de acesso à advocacia, preconizado pela Ordem, pode colocar de parte jovens que poderiam ser excelentes advogados, mas que não têm a oportunidade de fazer prova disso mesmo exercendo a profissão que desejam.
Outro problema é o desrespeito da deontologia profissional, essencialmente o relaxe das regras de cortesia, tão importantes que são para a confiança e a célere resolução de processos. À primeira vista tal parece incongruente, mas não é. A descortesia profissional é um sinal do mal-estar de uma profissão que se fecha sobre si mesma.
Em Janeiro de 2008, tive a oportunidade de escrever para a Revista Atlântico, juntamente com Adolfo Mesquita Nunes, um artigo sobre este tema. Os problemas de então, bem como as soluções referidas na altura, mantêm-se actuais. Há 8 anos sugerirmos a liberdade de associação, que ninguém aprova. No entanto, se não houver cuidado, é o que teremos.