O primeiro-ministro mexeu as peças no xadrez do Executivo e promete estabilidade, garantindo que novos ministros têm “provas dadas” e “experiência governativa” numa jogada sem inovação que envolve a movimentação de duas peças em um único lance. No cardápio da remodelação governamental em circuito fechado, João Galamba, secretário de Estado da Energia, subiu a ministro das Infraestruturas que estava nas mãos de Pedro Nuno Santos. E Marina Gonçalves foi promovida de secretária de Estado a ministra da Habitação, cuja pasta é separada numa área até agora acumulada pelo ministro cessante.

António Costa fez rasgados elogios a João Galamba, o jovem turco que se tentou moderar, mas que nos mais de quatro anos em que desempenhou funções como secretário de Estado da Energia não deixou de estar envolvido em várias polémicas como as nomeações de um antigo membro do seu gabinete como vogal da Entidade Reguladora do Sector Energético (ERSE) e de um técnico especialista para o seu gabinete com apenas 23 anos de idade.

Também não passou despercebido o episódio de mensagens privadas insultuosas a um utilizador do Twitter. Insultos que ignoram a doutrina de Costa para as redes sociais: nem à mesa do café os membros do Governo se podem esquecer que são membros do Governo. E que Galamba não seguiu também aquando da agressão verbal ao jornalismo em resposta a outro utilizador, ao não poupar nas palavras e classificar o programa “Sexta às 9” de “estrume” e “coisa asquerosa” na sequência de uma investigação sobre a existência de alegadas irregularidades na concessão à exploração de lítio em Montalegre, matéria sob a alçada do então secretário de Estado da Energia. Um negócio que está a ser alvo de uma investigação judicial à semelhança de um outro processo que, segundo a revista “Sábado”, o governante é suspeito de favorecimento do consórcio EDP/Galp/REN no milionário projeto do hidrogénio verde para Sines.

Polémicas a que se juntam os avisos de Galamba a Sócrates da Operação Marquês. E que parecem ser indiferentes ao Chefe do Governo que, segundo António Costa, “para grande surpresa de muitos, foi um grande secretário de Estado, com qualidades executivas muito grandes”, que registou “progressos na transição energética”, que revelou “capacidade de executar” e que tem “criatividade para resolver problemas”.

Ingredientes com que tempera os argumentos para a escolha de Galamba como ministro, numa opção que, a par de Marina Gonçalves, revela que promoveu escolhas internas para garantir que “não há descontinuidade das políticas” em resposta ao Presidente da República que dias antes alertou para a necessidade de “estabilidade política, ademais com um Governo de um só partido com maioria absoluta, mas, por isso mesmo, com responsabilidade absoluta”.

Na mensagem de Ano Novo, Marcelo Rebelo de Sousa avisou que esta estabilidade só o Governo de maioria absoluta pode “enfraquecer ou esvaziar” por “erros de orgânica”, ou por “descoordenação”, ou por “fragmentação interna”, ou “por inação”, ou por “falta de transparência”, ou por “descolagem da realidade”. Uma série de pecados capitais que Marcelo não quer ver repetidos e que, após conhecido o menu da nova composição do Executivo, já prometeu que retirará as suas conclusões se a remodelação governamental com “prata da casa” não funcionar.

Resta agora saber se a preocupação de Costa de não criar ruídos políticos, não recairá sobre ele próprio ao apostar numa pessoa num cargo político que já traz sinais de alarme. Uma espécie de receita do Chef, que tem revelado que, nos momentos-chave, opta por escolhas erradas que minam a autoridade e prestígio do Executivo, numa lógica taticista que não cuida do futuro.