Hodiernamente, como noutros tempos, é imperativo que a atuação dos órgãos da Ordem dos Advogados se concentre primacialmente na preservação da independência do exercício da profissão. Assim foi nos tempos do Estado Novo em que a Ordem dos Advogados se recusou a indicar representantes seus para a Câmara Corporativa e assim deve continuar a ser no presente. Disso mesmo foram exemplo as posições recentemente tomadas pelo Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados quando confrontado com a tentativa de liberalização do exercício da profissão em estruturas multidisciplinares, com a tentativa de criação de 23 concelhos de comarca provocando a extinção dos atuais Conselhos Regionais e as cerca de duas centenas de Delegações da Ordem dos Advogados e mais recentemente em matéria de recibos verdes e de proteção do segredo profissional no âmbito da Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais.

Contudo, o poder político e legislativo continua a assistir impávido e sereno a que agências de toda a natureza – imobiliárias, funerárias, contabilistas, consultoras, etc. – façam a intermediação de negócios jurídicos representando, em ato de procuradoria ilícita e em conflito de interesses, todas as partes no negócio, quando não podem representar nenhuma delas.

Neste âmbito, a lei n.º 49/2004, de 24 de agosto, que prevê os atos próprios dos advogados e solicitadores, desempenha um papel central na garantia da tutela efetiva dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e do acesso ao direito e aos tribunais. Mas, a efetividade desta tutela depende da clarificação rigorosa e do reforço dos atos próprios, definindo claramente o seu sentido e alcance e agravando as cominações previstas para o crime de procuradoria ilícita, nos exatos termos constantes do projeto de alteração da lei e do projeto de vinheta eletrónica, aprovados por iniciativa do então Conselho Distrital de Lisboa em assembleia distrital de 23 de abril de 2014 e recentemente relembrados nas conclusões aprovadas na X Convenção das Delegações realizada em Matosinhos.

Tais alterações à lei dos atos próprios visam tornar obrigatória a aposição de uma vinheta jurídica eletrónica ou física – esta última nos atos em que a primeira não seja possível – nos atos cuja prática a lei reserva aos advogados, nomeadamente, mas sem excluir outros, em qualquer tipo de contratos, nos documentos de constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, incluindo os documentos entregues nas conservatórias e cartórios notariais, assim como nos casos em que os atos preparatórios sejam praticados por advogados e solicitadores. Igualmente, se propõe proibir cidadãos e empresas sempre que estejam em causa atos próprios, de se fazerem representar por terceiros que não sejam advogados, sendo que a atual indefinição legal tem permitido a prática de procuradoria ilícita. Deve por último ser clarificado o papel dos advogados e solicitadores na cobrança de créditos, passando a abranger não apenas a negociação, mas todos os atos tendentes à cobrança de créditos, fechando a porta em definitivo a essa verdadeira praga que são as empresas de cobranças.

Ao garantir a intervenção de advogados nos atos acabados de referir, aumentar-se-á a segurança do tráfego jurídico e todos terão a ganhar com isso, sejam os cidadãos e as empresas, seja o próprio Estado que assistirá a uma diminuição da litigiosidade judicial e propiciará condições ideais para a criação de mais negócio.