O silêncio de António Costa com a pandemia de nomeações familiares no Governo é a exata medida da vergonha. Não tem nada a dizer! Falar só agravaria ainda mais a triste notoriedade desta deriva republicana que, segundo as contas do “Observador”, já soma mais de 40 competências governamentais geradas por uma consanguinidade digna das mais excelsas monarquias. (Marcelo Rebelo de Sousa, em ano eleitoral e a preparar a reeleição, não deixará de visitar o tema  no discurso do 10 de junho).

Estamos perante um caso similar ao das antigas viagens com o futebol. Era um direito adquirido Sua Excelência sentar-se no avião e voar até ao estádio, fosse onde fosse, à conta do habitual, e às vezes mendigado, convite. Sobretudo se alguém sugeria que o país, ou o partido, ou a empresa, ou até mesmo essa singular individualidade, fazia falta para apoiar a equipa, fosse ela qual fosse, tornava-se imperativo nacional e pessoal que não se perdesse o jogo por causa disso. Era o que mais faltava!

Como é público, foram precisos uns tantos escândalos para se perceber o óbvio – que, inclusivamente, era de bom senso, por maioria de razões para uma figura do Estado, identificar possíveis consequências de se sentar, sem motivo, ao lado de certas figuras. Mas só um regulamento disciplinou o problema. Em Portugal, se não estiver escrito, se o assunto não meter polícia, investigação, processo, não se espere que a ética associada ao serviço público nasça de geração espontânea.

Este caso deve envergonhar o PS, é claro, mas também a Democracia portuguesa no seu todo. Estamos perante mais uma emanação de um certo sentir nacional que começa na ‘cunha’, no ‘jeitinho’, consagra casos tão escalafriantes como o desta onda de nomeações familiares no Governo e desagua na corrupção. Tudo faz parte do caldo de cultura instalado. As diversas realidades justificam-se e criam o sistema de que Carlos César é um conceituado porta-voz, farol das mais abjetas declinações desta maneira de encarar uma vida de seita.

De qualquer maneira, por esta altura, já dispenso a repetida crítica ao Governo PS.

Identificado o problema, interessa-me sempre mais o passo seguinte: a solução. E, neste caso, pergunto: há por aí algum partido que tenha a coragem de avançar com a iniciativa legislativa que torne ilegal a possibilidade de repetição no futuro desta desavergonhada onda de familiares num governo? Se não há, então o melhor é calarem-se com a hipocrisia.

Todos os partidos se estão a esgotar nas palavras e eu tenho uma tese para isto. Aqui vai ela: com o fim da PT, a venda da EDP, o descalabro na CGD, o desaparecimento do BES, a maior monitorização das diversas empresas e, sobretudo, a nova ordem económica, existem agora muitos menos empregos disponíveis para os partidos, todos, satisfazerem as necessidades das clientelas e traficarem o pleno emprego da ‘família’. Se não forem o Governo e o Estado a reconhecerem as celebradas competências geradas em casa, o ingrato mundo empresarial não chega, porque esse, por agora, só pesca à linha entre quem pode canalizar negócio a curto prazo, como fazem as grandes construtoras, com a Mota-Engil à cabeça.

Estão a perceber ou não?