Criada há pouco mais de sete meses, a Associação de Limpeza Urbana (ALU), sediada em Cascais, assume como principal compromisso a prestação de serviços públicos. Luís Capão é o presidente desta entidade e, em entrevista ao Jornal Económico, deixa o alerta ao Governo para a falta de legislação neste setor.
Como nasce esta associação? Que medidas tem para este primeiro mandato?
A ALU surge da identificação de uma lacuna que existia num setor no qual politica e publicamente pouco ou nada se tem falado. Não há incentivos para este setor, não há a noção da quantidade de recursos que este setor envolve anualmente. O objetivo fulcral desta associação tem a ver única e exclusivamente com a prestação de serviço público. Outra questão crítica para nós foi o envolvimento dos setores privados. Um setor não pode funcionar sozinho. O Estado ou um setor público (câmaras, empresas municipais e intermunicipais) não podem achar que são ‘donos e senhores’ do conhecimento e daquilo que deve ser feito. Portanto, uma associação com cidades e sem o setor privado era ‘coxa’. Acho mesmo que sem o setor privado, esta associação não teria o interesse que vai passar a ter.
Em termos de cadernos de encargos passa desde logo pela abordagem aos serviços, criar conhecimento, recolher informação. Depois criar parcerias com fornecedores de equipamentos e serviços, com o Governo, mas primeiro temos de conhecer o estado da limpeza urbana em Portugal. Quantas pessoas e recursos envolve? Qual é o valor de financiamento? Neste momento, não fazemos a mínima ideia de quanto vale este setor no país. Outra abordagem passa pelo contacto com os cidadãos, que são cada vez mais os responsáveis por aquilo que são as cidades hoje em dia. O cidadão tem de ser envolvido como uma solução naquilo que é a economia circular e onde temos desafios como a água reciclada. Em Cascais, usamos 100% da água da ETAR para a lavagem das ruas. Já temos também os caixotes inteligentes que já existem em toda a Europa, mas em Portugal fomos os primeiros.
Pretendem incluir mais cidades além destas 12?
Claro que sim. Objetivamente já começámos a receber o interesse de outras cidades. Na reunião da comissão instaladora decidiu-se que as cidades tinham de ter representatividade nacional, não queríamos que fossem da Grande Lisboa ou Porto.
O que achou do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC)?
O Governo tem de ter uma ideia clara do que pretende e fomentar essa ideia. O Governo tem ouvido todas as pessoas, muito diálogo, mas tem de ter mais capacidade de influenciar a abordagem ambiental e isso só se faz com legislação. Continuamos a ter um défice de legislação e orientações claras sobre qual é o modelo que deve ser adequado. Por exemplo, nas metas de reciclagem continua a existir controvérsia quer nas metas atuais, ou seja onde é que estamos agora, quer aquilo que deve ser a abordagem no futuro. O Governo tem de ser mais claro na definição de um caminho e estar recetivo a poder ter o ónus do sucesso ou assumir o insucesso dessas políticas. No caso dos resíduos e da recolha da limpeza urbana não tem sido absolutamente tocada em nada pelo Governo. Não há uma obrigatoriedade do Governo em que todas as autarquias têm de ter um regulamento que deve incluir as áreas específicas dos desafios para a limpeza urbana. A aquisição de serviços que permitam aumentar a eficiência, isto não tem havido. O que há normalmente é financiamento para a aquisição de equipamentos ou pilotos.
Nós sabemos que equipamentos existem, mas muitas vezes as autarquias não sabem que equipamentos utilizar para melhorar a vida na sua cidade. O Governo devia apostar no financiamento para capacitação intelectual, com a contratação de pessoas que venham pensar estrategicamente.
Olhando para o panorama internacional de que países podemos retirar bons exemplos para a limpeza urbana?
A França tem uma associação de limpeza urbana que fez um estudo em todas as cidades, onde identificaram os seus maiores problemas. A maior dificuldade que as cidades têm neste momento é a ligação do glifosato [herbicida potencialmente cancerígeno] e as suas alternativas. A França já aboliu há muito tempo o glifosato, em Itália muitas cidades também. A Espanha tem cidades que são um exemplo daquilo que é a limpeza urbana, como Oviedo ou Bilbao. Em Portugal, a cidade de Braga tinha imensos problemas com a recolha porta-a-porta então compraram contentores de recolha lateral, onde chegam camiões com um motorista e ele faz tudo sozinho. Só é possível fazer esta transição se houver necessidade e vontade política. Temos sentido falta de políticas que orientem as cidades e que sejam claras para os cidadãos e os comportamentos que nós esperamos deles. O exemplo dos sacos de plástico, no início desta legislatura houve uma crítica de que as receitas dos sacos de plástico não eram as que se esperava que tivessem sido, porque o Governo anterior tinha feito mal as estimativas. Ainda bem, porque o objetivo de uma política como a compra dos sacos de plástico nos supermercados era exatamente que não tivesse receita nenhuma, pois isso significa que as pessoas estão a mudar os seus comportamentos.
Entrevista publicada na edição do JE de 28-06-019
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