Nos seus últimos artigos no “New York Times”, Paul Krugman, prémio Nobel da Economia, acusa a Alemanha de viabilizar a guerra de Putin por não restringir completamente as importações de gás da Rússia.

Os seus argumentos baseiam-se em estudos do Bruegel Institute ou da Agência Internacional de Energia que consideram que a Alemanha pode sobreviver sem o gás russo. Alega também que a mesma Alemanha que foi intolerante com os países do Sul da Europa na última crise financeira, não consegue ter agora, face à invasão da Ucrânia, o grau de responsabilidade que exigiu dos seus parceiros.

Krugman tem razão quando se preocupa com a dependência alemã – 55% do seu gás provém da Rússia.  E quando afirma que a Alemanha gerou esta dependência – a estratégia alemã do século XXI foi atrair as economias de Leste que saiam da esfera soviética, tendo a veleidade de acreditar que todos acabariam por se libertar da influência russa, mas esquecendo-se da sua economia. Tem ainda razão quando refere que a Alemanha exigiu sacrifícios ao sul europeu – e a seu tempo alertou para o pesadelo que se viveu em Portugal com a purga infligida pela Troika.

Mas a insistência de Krugman em defender que a Alemanha cesse as importações da Rússia terá dificuldade em ser ouvida pelos dirigentes deste país. Segundo o “Der Spiegel”, o sector transformador alemão paralisa se a Rússia cortar o fornecimento de gás à Alemanha ou se a União Europeia (UE) impuser um embargo às importações da Rússia, gerando uma recessão mais severa do que a que acabamos de atravessar.

A revista “Time” lembra que, sem poder recorrer ao gás russo, a Alemanha arrisca-se a ter que adiar o encerramento de reatores nucleares e de centrais a carvão, comprometendo a sua transição verde. Ironicamente, há pouco tempo Berlim defendia o gás como um investimento verde, preferível à energia nuclear.

Mas o dilema da UE é que forçar o corte das trocas entre a Alemanha e a Rússia penalizará a Rússia, mas também a economia europeia, fruto do peso da Alemanha neste espaço de integração – em julho de 2020, o PIB alemão representava 24,7% do PIB da União Europeia e a indústria 32,5% do valor acrescentado no setor (Eurostat, 2021).

E, como agravante, à recuperação da crise junta-se agora a causa humanitária de absorver milhões de refugiados ucranianos, fornecendo asilo e criando postos de trabalho, o que exigirá um esforço económico significativo da União Europeia (UE) e em particular das suas economias mais robustas.

Será provavelmente por tudo isto, e não por nutrir nenhuma simpatia especial pela Rússia, que a Comissão Europeia hesita em tomar medidas mais duras contra este país.

Esta é a União que a Europa erigiu, dominada por um país de cujas opções muitas vezes discorda, mas ao qual aceitou ligar-se por uma moeda, ainda que ciente da sua dependência. Paul Krugman, conhecedor das fragilidades estruturais da zona euro, e cético quanto ao projeto de moeda única europeia, conhece bem este edifício. Os seus argumentos são reconfortantes, deixando-o daquele que acredita ser o lado certo da guerra, mas saberá certamente quão difícil será à Alemanha seguir os seus conselhos no atual contexto.

E os países da União, por mais insatisfeitos que possam estar com as opções alemães, terão que encontrar conforto na ideia de que este foi o compromisso assumido para não mais terem que temer a guerra.